segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Líder indígena reclama dos efeitos de mudança climática no Xingu

Ondas de calor jamais sentidas. Ventos acima da média. Rios cada vez menos caudalosos. Esse é o cenário atual da região do Alto Xingu, segundo o chefe indígena Raoni Txucarramãe, líder da etnia caiapó.

Conhecido ícone da causa ambientalista, o líder caiapó - que chegou a viajar para o exterior acompanhado do músico britânico Sting - foi na sexta-feira (23) o convidado de honra de um evento em Cuiabá (MT) que discutiu os impactos do aquecimento global no Centro-Oeste.

Ele falou sobre como a mudança climática afeta os índios. Com "aproximadamente 87 anos", Raoni disse que queimadas, desmatamento e grandes obras de infraestrutura previstas para a região amazônica, como a usina de Belo Monte (PA), poderão agravar os efeitos já sentidos hoje.

"O calor está intenso, os ventos são muitos mais fortes do que eram antes e o nível dos rios na seca é diferente do que era tempos atrás. Estou muito preocupado, pois estou vendo acontecer tudo o que vinha falando há tanto tempo", disse.

Segundo Raoni, não é apenas a etnia caiapó que percebe as mudanças. "Vários outros povos do Alto Xingu estão assustados com o calor e a ventania. Há muito tempo era bom, tinha muita floresta e a gente vivia tranquilo. Agora temos medo que o Xingu possa secar."

Sobre a usina de Belo Monte --que será uma das maiores do mundo-, Raoni disse que os "projetos de desenvolvimento do governo brasileiro" devem respeitar "os índios e suas terras. Por isso, fiquei indignado com o que o ministro disse."

Ele faz referência a declarações do ministro Edison Lobão (Minas e Energia), para quem o projeto da usina sofre oposição de "forças demoníacas".

"Estou preocupado com Belo Monte e acho que seria bom mesmo o rio ficar lá quieto, em seu leito e sem barragem. Temos o direito de viver em nossa terra", diz Raoni.

Percepção - A percepção de Raoni sobre o clima no Alto Xingu pode não estar diretamente relacionada a um fenômeno global, diz o engenheiro florestal Maurício Philipp, coordenador do departamento de mudanças climáticas do governo de Mato Grosso.

Alterações na cobertura vegetal da região do Xingu (norte de MT e sul do PA) poderiam explicar, por exemplo, o agravamento da estiagem. "Se há um desmatamento maior, há interferência no ciclo hidrológico. Sem a cobertura vegetal, não há retenção da água da chuva para os canais de drenagem, por exemplo", disse Philipp.

Mesmo cientistas não têm condições de diferenciar bem o que é "variabilidade natural do clima e o que pode ser atribuído à uma mudança provocada por ações antrópicas", diz.

"No caso do Xingu, acredito em alterações regionais, no microclima. Isso não descarta a possibilidade de existir algum efeito global se manifestando, mas é algo que precisa ser muito bem analisado para que se possa afirmar com segurança." Rodrigo Vargas/ Folha Online

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