sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A partitura dos pássaros

TEDxSP 2009 - Jarbas Agnelli: "Birds on the Wires", uma música e sua história from TEDxSP on Vimeo.



Jarbas Agnelli: “Pássaros nos fios”, uma música e sua história.

No fim de agosto de 2009, o músico Jarbas Agnelli abriu seu jornal e deparou-se com uma foto de pássaros pousados em cabos elétricos. A disposição lembrava tanto o desenho de notas musicais, que ele teve a ideia de lê-la como tal e compor uma música. Quando terminou, mandou o resultado para o fotógrafo Paulo Pinto, do Estado de São Paulo, que havia feito a foto no interior do Rio Grande do Sul. Emocionado, ele enviou a imagem original que era mais larga do que a publicada e continha os acordes que faltavam para completar a melodia. O resultado é lírico. Fez tanto sucesso que ganhou o mundo. Conheça os detalhes da história e ouça a melodia no vídeo.
O ECO

Como barrar a extinção dos vertebrados


Por Stephen Leahy, da IPS




Nagoya, Japão, 29/10/2010 – Um quinto dos vertebrados do mundo – seis milhões de formas de vida insubstituíveis – está ameaçado de extinção, conforme estudo apresentado na 10ª Conferência das Partes (COP 10) do Convênio sobre Diversidade Biológica. Desmatamento, expansão agrícola, pesca excessiva, espécies exóticas invasoras e a mudança climática são causas específicas, mas o principal motor de destruição é um sistema econômico cego para a realidade de que sem natureza não existe economia ou bem-estar humano, afirmam os especialistas.

“Sem esforços mundiais de conservação, a situação será muito pior, disse Simon Stuart, presidente da Comissão de Sobrevivência de Espécies da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) na apresentação do informe, no dia 28, nesta cidade japonesa. O estudo é a avaliação mais exaustiva sobre os vertebrados do mundo – mamíferos, pássaros, anfíbios, répteis e peixes –, publicada no mesmo dia na revista especializada Science, disse Simon.

Anualmente, 52 espécies de mamíferos, aves e anfíbios avançam entre um e três passos no caminho para o desaparecimento, segundo o estudo, que utilizou dados de 25 mil espécies da Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas da UICN. O sudeste da Ásia sofreu as perdas mais drásticas dos últimos tempos, devido, principalmente, aos cultivos de exportação como a palma, bem como à extração comercial de madeiras nobres, conversão de terras silvestres em arrozais e caça insustentável, concluiu a pesquisa.

Algumas áreas da América Central, os Andes tropicais e inclusive a Austrália também registram perdas importantes, em particular devido ao impacto do mortal fungo chytrid nos anfíbios. “Está havendo erosão na coluna vertebral da biodiversidade”, disse o destacado ecologista e escritor norte-americano Edward O. Wilson, da Universidade de Harvard. “Um pequeno passo para o topo da Lista Vermelha é um salto gigante para a extinção. Esta é apenas uma pequena janela para as perdas mundiais que estão ocorrendo”, afirmou Edward em um comunicado.

A palavra biodiversidade, mais conhecida como natureza, se refere a plantas, animais e micro-organismos e aos seus ecossistemas, que proporcionam à humanidade alimentos, remédios, água e ar, abrigo e um ambiente saudável para viver. “A coluna vertebral da natureza está efetivamente em risco”, disse Julia Marton-Lefèvre, diretora-geral da UICN, que em uma entrevista coletiva em Nagoya destacou que um terço de todas as espécies estão ameaçadas. A Perspectiva Mundial sobre a Biodiversidade 3, ou GBO 3, apresentada em maio, concluiu que um quarto das espécies vegetais está ameaçado, os corais e os anfíbios do planeta estão em grave declínio e a quantidade de vertebrados diminuiu um terço nos últimos 30 anos.

Apesar deste panorama, é muito improvável que a União Europeia (UE) destine à proteção da biodiversidade mais dinheiro além do US$ 1,4 bilhão prometido em setembro na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, disse à IPS o legislador alemão Jo Leinen. “Estamos reduzindo nossos orçamentos, por isso será difícil oferecer fundos adicionais aqui”, disse Jo, que encabeçou a delegação de europarlamentares em Nagoya.

Jo preside o Comitê de Meio Ambiente do Parlamento Europeu e dirigiu uma sessão sobre selvas no fórum realizado em Nagoya pela Organização Global de Legisladores para o Equilíbrio Ambiental (Globe). O grupo pediu à UE que assuma urgentes compromissos de longo prazo para que os fundos estejam disponíveis a cada ano ao longo da próxima década, afirmou Jo. O Japão prometeu US$ 2 bilhões no prazo de três anos.

Segundo a UICN, o financiamento público e privado para conservar a biodiversidade deveria passar dos atuais US$ 3 bilhões anuais para US$ 300 bilhões. Não surpreende que este assunto seja um dos mais espinhosos para se chegar a um acordo antes do término da COP 10 no Japão. O fato de mais de cem ministros de Meio Ambiente terem chegado a Nagoya não é necessariamente esperançoso, pois a maioria está abaixo, na hierarquia ministerial, de seus colegas de Economia ou Finanças. Inclusive o presidente do Banco Mundial (BM), Robert Zoellick, reconheceu esta realidade na abertura do segmento ministerial da COP 10.

“A biodiversidade não é um acessório. Preservar ecossistemas e salvar espécies não são luxos para os ricos. A conservação e o desenvolvimento podem seguir juntos. Nosso hábitat e nosso planeta não merecem menos”, disse aos delegados o presidente do BM. O Banco Mundial dedicará esforços para financiar a proteção “dos serviços dos ecossistemas e a biodiversidade”, anunciou.

O BM espera que a conservação da biodiversidade seja incorporada a planos de crescimento econômico, infraestrutura e superação da pobreza. Para isso, lançou ontem uma nova associação mundial para ajudar os governos a integrarem o valor da biodiversidade e dos serviços da natureza às suas contas nacionais e aos seus planos de desenvolvimento. “A conservação funciona”, disse Simon. Nos últimos anos, impediu-se a extinção do rinoceronte branco e de outras 63 espécies, observou.

O estudo publicado na Science mostra que a perda de espécies se acentuou pela falta de medidas para evitá-la, que o desafio é proteger as espécies e os ecossistemas, enquanto são protegidos e potencializados os meios de vida das populações locais, reconheceu Simon. Envolverde/IPS

Custo da preservação

Durante a Conferência da Biodiversidade na COP10, em Nagoya, Japão, diretores dos oito países responsáveis pelas áreas protegidas da Amazônia apresentaram o primeiro relatório regional sobre a floresta, instituindo um plano de ação para a região no período de 2011 a 2020. O relatório é a tentativa de praticar as metas do Programa de Trabalho de Áreas Protegidas (PoWPA).

O objetivo regional do relatório é gerar estratégias conservacionistas integradas para os ecossistemas amazônicos, para desfragmentar as ações de proteção em função das fronteiras políticas. Os países amazônicos já investiram 100 milhões de dólares por ano na manuntenção das áreas protegidas da região, porém existe uma necessidade de pelo menos mais 150 milhões, além de investimentos em infraestrutura (aproximadamente 500 milhões) para que a preservação seja realmente consolidada.

A importância do bioma amazônico na preservação pode ser observado pelo período de 2003 a 2009 quando 78% das áreas protegidas foram implementadas na Amazônia, totalizando 2,16% das reservas mundiais. Por essas razões, os governos apontam que contribuições financeiras internacionais devem ajudar na captação dos recursos necessários para a real preservação.O ECO

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Mato Grosso aprova zoneamento manipulado

O governo de Mato Grosso resolveu prorrogar por mais dois anos o programa MT Legal, precursor do programa federal Terra Legal, que livra fazendeiros que descumpriram a legislação ambiental de multa desde que se cadastrem junto ao estado e se comprometam a recuperar o que destruíram ilegalmente. A decisão foi tomada após reunião com a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso (Famato), com a justificativa de não prejudicar os produtores rurais se o Código Florestal for alterado.

A questão é: se os fazendeiros que derrubaram além do limite das suas reservas legais aderirem ao Cadastro Ambiental Rural (CAR), estarão se comprometendo a recuperar com base nas porcentagens atuais, ou seja, 80% para quem tem áreas no bioma amazônico. Mas, se as alterações propostas pelo relator e deputado Aldo Rebelo (PcdoB-SP) forem referendadas pelo Congresso, a maioria dos produtores irregulares terá como base uma recuperação de no máximo 50% da área, não 80%. Por isso, em vez de estimular a recuperação das áreas destruídas ilegalmente, o goveno preferiu colocar as barbas de molho e aguardar que o Código Florestal seja mesmo flexibilizado.

O Instituto Centro de Vida (ICV) emitiu uma nota nesta quarta-feira condenando a decisão do governo de Mato Grosso, que valorizou a vontade da federação que representa o agronegócio sem que a entidade tenha colaborado com a implementação do programa de regularização. Quem ajudou no processo, como alguns municípios, ficaram de fora do diálogo com o estado. “O argumento usado para justificar o pedido de prorrogação é enganoso, já que a regulamentação do MT Legal prevê, explicitamente, a incorporação ao Programa de “eventuais benefícios advindos com a aprovação do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico (ZSEE) e alterações legislativas estaduais e federais”, diz o instituto em nota.

O MT Legal foi criado em agosto de 2008, implantado em novembro de 2009, e estabeleceu até novembro de 2010 o prazo para adesões. O ICV considerou que, agora, não se trata de prorrogação, mas de adiamento do programa e seus objetivos, além de não valorizar em nada quem se cadastrou dentro do tempo determinado.

Zoneamento ruralista

Na manhã desta quarta-feira, outra notícia desalentadora veio de Mato Grosso. A Assembléia Legislativa aprovou o substitutivo integral 3 do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico do estado. Para quem não está lembrado, trata-se da lei que ficou mais de uma década em discussão e nos meses finais para sua aprovação ganhou novas versões retirando da proposta áreas protegidas e acrescentando áreas para agricultura, à revelia de tudo que foi discutido com a sociedade civil.

Como esta foi a segunda votação na Assembléia Legislativa, agora a lei segue para sanção do governador.

Releia aqui o artigo “Zoneamento, a fraude dos ruralistas”, de Miguel Aparício, gestor do Programa de Conservação de Terras Indígenas da OPAN e Coordenador do Fórum Mato-grossense de Meio ambiente e Desenvolvimento (FORMAD)

(Andreia Fanzeres/O ECO/Minha casa Meu mundo)

Mudar o desenvolvimento para salvar a biodiversidade


Por Stephen Leahy, da IPS

Nagoya, Japão, 27/10/2010 – Uma drástica mudança no rumo do desenvolvimento econômico é essencial para evitar o desaparecimento dos ecossistemas do planeta, que são a base da vida, afirma um estudo publicado ontem na revista científica norte-americana Science. A mudança climática, a contaminação, o desmatamento e as transformações no uso da terra empurram as espécies à extinção, reduzindo sua abundância e os lugares que habitam.

“As sociedades e as infraestruturas humanas evoluíram e dependem de espécies e ecossistemas particulares”, disse Paul Leadley, da Universidade de Paris-Sud, que encabeçou o estudo. “Mesmo os cenários mais otimistas para este século sistematicamente preveem a extinção e a redução das populações de muitas espécies”, declarou Paul, da França, à IPS em conversa telefônica. A meta de frear a perda de biodiversidade até 2020 está sendo discutida esta semana nesta cidade japonesa, onde acontece a 10ª Conferência das Partes do Convênio sobre Diversidade Biológica. Porém, o objetivo de 2020 é, tristemente, algo “irreal”, admitiu Paul, baseando-se em cinco recentes estudos ambientais mundiais.

Paul e seu colega Henrique Miguel Pereira, da Universidade de Lisboa, lideraram uma equipe de 23 cientistas de nove países que compararam os resultados dos últimos estudos e uma ampla gama de literatura para avaliar as possíveis mudanças futuras na biodiversidade. A análise traça uma inevitável e contínua perda de biodiversidade no Século 21, mas oferece esperanças de que possa diminuir essa deterioração se forem adotadas as medidas políticas adequadas.

O termo biodiversidade é usado para descrever a ampla gama de variedades de seres viventes – árvores, insetos, plantas, animais – que formam a infraestrutura biológica e nos fornecem saúde, riqueza, alimento, água, combustível e outros serviços úteis. Muitos não entendem o quanto a humanidade é dependente de numerosos serviços proporcionados pela natureza e a rapidez com que isto está mudando, afirmou Paul.

Embora a atenção pública se concentre na extinção de espécies, é a mudança em sua distribuição e no tamanho de suas populações, o ponto mais grave para o bem-estar humano, bem como os melhores indicadores da pressão que é exercida pelas pessoas sobre os ecossistemas, diz o estudo. Nos oceanos, a combinação de pesca em excesso e mudança climática – causada pelas emissões de dióxido de carbono das atividades humanas – está transformando rapidamente a vida marinha a ponto de no futuro haver menos peixes grandes.

Além disso, o desmatamento e o aquecimento global estão transformando as paisagens terrestres. Uma pesquisa na selva amazônica concluiu que, se as temperaturas mundiais aumentarem dois graus centígrados, como parece provável, a mescla de incêndios com desmatamento acabará com a capacidade única dessa região para gerar a metade de sua própria chuva. Sem estas, a selva se converterá em região de pradarias, causando maciça liberação de dióxido de carbono e a perda de muitas espécies.

Mesmo se o desmatamento terminasse, a maior parte da selva amazônica poderia desaparecer em 50 ou 60 anos devido ao aquecimento do planeta, disse o biólogo Thomas Lovejoy, principal conselheiro sobre biodiversidade do presidente do Banco Mundial e membro do painel científico assessor do Fundo para o Meio Ambiente Mundial. “Dois graus de aquecimento será algo duradouro para muitos ecossistemas. As florestas tropicais estarão em dificuldades. Haverá poucos arrecifes de coral, a temperatura das florestas será muito diferente da atual”, afirmou Lovejoy à IPS em Nagoya.

Uma solução para esfriar o planeta e salvar a selva amazônica é restaurar florestas e áreas verdes, com a finalidade de remover dióxido de carbono da atmosfera, acrescentou o cientista. O crescimento econômico deve deixar de focar os lucros que proporciona a conversão de terras e procurá-los por meio da restauração da biodiversidade. Combater a mudança climática é uma forma de frear a perda de diversidade biológica, disse Paul. Colocar preço nas emissões de carbono em todas suas formas, desde a gerada pelo desmatamento até a agricultura seria uma maneira de enfrentar o problema, prosseguiu.

O desmatamento e a agricultura contribuem com 35% a 50% de todas as emissões de gás carbono na atmosfera. Também são os principais causadores da conversão de ecossistemas naturais. É necessário um forte peso de impostos sobre as emissões, incentivo aos esforços para capturar carbono e criação de áreas protegidas efetivas. Proteger apenas 20% da terra e 15% do mar, segundo proposto originalmente como meta para 2020 no Convênio, não é suficiente para deter a perda de biodiversidade.

As ações devem ser adotadas com urgência, disseram os cientistas, já que a janela de oportunidades se fecha rapidamente. Medidas imediatas poderiam garantir até 2030 uma ampliação de 15% das áreas florestais do planeta, mas a falta de ações pode gerar uma perda superior a 10% destas até esse ano. O maior desafio continua sendo convencer os políticos.

Os cientistas acreditam que a criação da Plataforma sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas (IPBES, um mecanismo do grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática - IPCC) poderia fazer uma diferença. “Os temas são tão urgentes e o que está em jogo para a humanidade é tão importante que os cientistas devem unir-se e, por meio do IPBES, e informar os governantes com voz única e autorizada”, disse Henrique Miguel. Delegações governamentais expressaram em Nagoya seu apoio à criação do IPBES, mas alguns negociam seu apoio para conseguir a aprovação de um acordo sobre o acesso equitativo aos recursos biológicos. Envolverde/IPS

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Os expulsos da Terra


Valerio Calzolaio*

As chuvas provocadas pelo vento de monção no norte do Paquistão, o transbordamento de rios e riachos, a inundação no campo e nas cidades, os sucessivos aumentos das correntes no centro e sul desse país, a contaminação de aquedutos, a lentidão do socorro, a fuga dos afetados e o desespero e a raiva foram o centro de muitas notícias. A morte comprovada inicialmente de quase duas mil pessoas, milhares de desaparecidos, seis milhões que perderam suas casas, dez milhões de evacuados e 20 milhões de paquistaneses afetados constituem um saldo trágico e estarrecedor.

Esses evacuados poderiam muito bem ser definidos como “refugiados climáticos” ou “ecorrefugiados”. De fato, foi um desastre de dimensão planetária. No entanto, os ecorrefugiados quase desapareceram dos meios de comunicação, que há dois meses nada noticiam sobre a catástrofe no Paquistão e suas consequências, embora centenas de milhares ainda se encontrem em acampamentos precários. Nas últimas semanas, entretanto, sabe-se de muitos outros refugiados ambientais em diferentes regiões do mundo, na Indonésia, Amazônia e ultimamente no Danúbio húngaro. São migrantes forçados por causa das más decisões e de comportamentos equivocados de outros humanos.

Em 2008 e 2009, o número de refugiados “políticos” no mundo era de aproximadamente 15 milhões, enquanto o de ecorrefugiados internacionais era maior. E também os refugiados políticos internos (aqueles que não passaram as fronteiras de seu país) agora são em menor número do que os ecoforagidos internos. As Nações Unidas deveriam promover programas e instrumentos para prevenir e dar assistência aos ecoforagidos. Fiz uma reflexão sobre este drama em um livro lançado recentemente na Itália.

Gostemos ou não, centenas de milhares de refugiados chegam à Europa a cada ano e pode-se prever que aumentarão no futuro. São forçados a abandonar suas casas, seus países, e nem todos podem permanecer sempre em acampamentos e nem todos conseguem se restabelecer em suas pátrias. É melhor nos darmos conta disso a tempo. Sei que sempre houve ecorrefugiados, desde a noite dos tempos. As migrações de indivíduos e grupos de nossa espécie sempre tiveram causas entrelaçadas com efeitos e impactos ambientais e climáticos.

Na história da espécie humana as outras grandes causas de migrações são as guerras e os conflitos. Hoje, os refugiados por razões políticas (violência ou perseguição por parte de instituições ou comunidades humanas) adquirem o status de “refugiados” e são ajudados por uma convenção e por um Alto Comissariado das Nações Unidas. Também os ecoforagidos são vítimas do comportamento de outros seres humanos, embora não tivesse sentido dar a eles o mesmo status que é concedido às vítimas de perseguições políticas. Encontremos, então, um modo específico de assisti-los.

É possível prever que nos próximos 20 anos serão dezenas de milhões de novos ecoforagidos, sobretudo em algumas áreas, e antes de tudo para a Europa, em particular através do Mar Mediterrâneo. Dos informes do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) surgem previsões sobre alguns impactos globais, inequívocos, embora em dimensões diversas nos vários cenários temporários e com um grau diverso de vulnerabilidade geográfica.

Os riscos (reais) de mortes por inundações aumentaram 13% de 1990 a 2007 e a proporção de populações afetadas subiu 28%. Além disso, com base nas experiências do passado e dos cenários de previsão, mais de 75% dos riscos se concentrarão em poucos países. Precisamente aqueles afetados pelas monções, Bangladesh, Índia, Paquistão e China. Quanto às migrações forçadas, de agora até 2050, o risco de se converter em ecoforagidos alcança, no melhor dos casos, a não menos de 200 milhões de pessoas.

* Valerio Calzolaio, jornalista, ecologista e ex-parlamentar italiano, é autor de “Ecorrefugiados: as Migrações Forçadas de Ontem, Hoje e Amanhã”. Direitos exclusivos IPS.

Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.

sábado, 23 de outubro de 2010

Alerta! Projeto autoriza estados a regular uso das margens de rios e lagos

A Câmara analisa o Projeto de Lei 7183/10, que autoriza os estados e o Distrito Federal a regular a utilização das áreas de florestas ou outra formas de vegetação situadas nas margens de rios, lagos, lagoas ou reservatórios d’água naturais ou artificiais, quando se tratar de áreas urbanas. O projeto, do deputado Fernando Lopes (PMDB-RJ), modifica o Código Florestal (Lei 4.771/65), que considera essas áreas como de preservação permanente (APPSão faixas de terra ocupadas ou não por vegetação nas margens de nascentes, córregos, rios, lagos, represas, no topo de morros, em dunas, encostas, manguezais, restingas e veredas. Essas áreas são protegidas por lei federal, inclusive em áreas urbanas. Calcula-se mais de 20% do território brasileiro estejam em áreas de preservação permanente (APPs). As APPs são previstas pelo Código Florestal. Os casos excepcionais que possibilitam a intervenção ou supressão de vegetação em APP são regulamentados pelo Ministério do Meio Ambiente.).

Segundo o autor, o projeto vai corrigir o “exagero” contido no Código Florestal, que impede a utilização das faixas de terra próximas a córregos e lagoas. A faixa de terra protegida pela lei depende da largura do curso d’água, variando de 30 a 500 metros. Para Lopes, a consequência do “exagero” é o descumprimento da lei. “Embora a regulação da utilização dessas faixas às margens dos córregos e lagoas seja vedada, observa-se a progressiva ocupação irregular das mesmas, inclusive comprometendo mais ainda a qualidade dos corpos d”água”, argumenta.

O deputado acredita que, em áreas urbanas densas, não faz sentido usar as regras gerais do Código Florestal, “até porque não há, salvo raras exceções, propriamente florestas, mas tão somente e, no máximo, alguns poucos espécimes muitas vezes exóticos”. Fernando Lopes acredita que uma legislação estadual “mais próxima da realidade”, associada às regras municipais aplicáveis, é a melhor solução para essas áreas.

O projeto foi apensado ao PL 4006/08, do falecido deputado Max Rosenmann, que também altera o Código Florestal no que diz respeito à área de preservação permanente e à reserva legal. A matéria, de caráter conclusivo. Rito de tramitação pelo qual o projeto não precisa ser votado pelo Plenário, apenas pelas comissões designadas para analisá-lo. O projeto perderá esse caráter em duas situações: - se houver parecer divergente entre as comissões (rejeição por uma, aprovação por outra); - se, depois de aprovado pelas comissões, houver recurso contra esse rito assinado por 51 deputados (10% do total). Nos dois casos, o projeto precisará ser votado pelo Plenário., será analisada pelas comissões de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural; de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

(Agência Câmara)

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

O voto do Nordeste e as elites


Por Tânia Bacelar de Araujo

O Nordeste liderou o crescimento do emprego formal no país com 5,9% de crescimento ao ano entre 2003 e 2009, taxa superior a de 5,4% registrada para o Brasil como um todo, e aos 5,2% do Sudeste, segundo dados da RAIS. Daí a ampla aprovação do Governo Lula em todos os Estados e nas diversas camadas da sociedade nordestina se refletir na acolhida a Dilma. Não é o voto da submissão - como antes - da desinformação, ou da ignorância. É o voto da auto- confiança recuperada, do reconhecimento do correto direcionamento de políticas estratégicas. É o voto na aposta de que o Nordeste não é só miséria (e, portanto, "Bolsa Família"), mas uma região plena de potencialidades. O artigo é de Tânia Bacelar de Araújo.

A ampla vantagem da candidata Dilma Rousseff no primeiro turno no Nordeste reacende o preconceito de parte de nossas elites e da grande mídia face às camadas mais pobres da sociedade brasileira e em especial face ao voto dos nordestinos. Como se a população mais pobre não fosse capaz de compreender a vida política e nela atuar em favor de seus interesses e em defesa de seus direitos. Não “soubesse” votar.

Desta vez, a correlação com os programas de proteção social, em especial o “Bolsa Família” serviu de lastro para essas análises parciais e eivadas de preconceito. E como a maior parte da população pobre do país está no Nordeste, no Norte e nas periferias das
grandes cidades (vale lembrar que o Sudeste abriga 25% das famílias atendidas pelo “Bolsa Família”), os “grotões”- como nos tratam tais analistas ? teriam avermelhado. Mas os beneficiários destes Programas no Nordeste não são suficientemente numerosos para
responder pelos percentuais elevados obtidos por Dilma no primeiro turno : mais de 2/3 dos votos no MA, PI e CE, mais de 50% nos demais estados, e cerca de 60% no total ( contra 20% dados a Serra).

A visão simplista e preconceituosa não consegue dar conta do que se passou nesta região nos anos recentes e que explica a tendência do voto para Governadores, parlamentares e candidatos a Presidente no Nordeste.

A marca importante do Governo Lula foi a retomada gradual de políticas nacionais, valendo destacar que elas foram um dos principais focos do desmonte do Estado nos anos 90. Muitas tiveram como norte o combate às desigualdades sociais e regionais do Brasil. E isso é bom para o Nordeste.

Por outro lado, ao invés da opção estratégica pela “inserção competitiva” do Brasil na globalização – que concentra investimentos nas regiões já mais estruturadas e dinâmicas e que marcou os dois governos do PSDB -, os Governos de Lula optaram pela integração
nacional ao fundar a estratégia de crescimento na produção e consumo de massa, o que favoreceu enormemente o Nordeste. Na inserção competitiva, o Nordeste era visto apenas por alguns “clusters” (turismo, fruticultura irrigada, agronegócio graneleiro…) enquanto nos anos recentes a maioria dos seus segmentos produtivos se dinamizaram, fazendo a
região ser revisitada pelos empreendedores nacionais e internacionais.

Por seu turno, a estratégia de atacar pelo lado da demanda, com políticas sociais, política de reajuste real elevado do salário mínimo e a de ampliação significativa do crédito, teve impacto muito positivo no Nordeste. A região liderou – junto com o Norte – as vendas no comercio varejista do país entre 2003 e 2009. E o dinamismo do consumo atraiu investimentos para a região. Redes de supermercados, grandes magazines, indústrias alimentares e de bebidas, entre outros, expandiram sua presença no Nordeste ao mesmo tempo em que as pequenas e medias empresas locais ampliavam sua produção.

Além disso, mudanças nas políticas da Petrobras influíram muito na dinâmica econômica regional como a decisão de investir em novas refinarias (uma em construção e mais duas previstas) e em patrocinar – via suas compras – a retomada da indústria naval brasileira, o que levou o Nordeste a captar vários estaleiros.
Igualmente importante foi a política de ampliação dos investimentos em infra-estrutura – foco principal do PAC – que beneficiou o Nordeste com recursos que somados tem peso no total dos investimentos previstos superior a participação do Nordeste na economia nacional.

No seu rastro,a construção civil “bombou” na região.

A política de ampliação das Universidades Federais e de expansão da rede de ensino profissional também atingiu favoravelmente o Nordeste, em especial cidades médias de seu interior. Merece destaque ainda a ampliação dos investimentos em C&T que trouxe para Universidades do Nordeste a liderança de Institutos Nacionais ? antes fortemente concentrados no Sudeste – dentre os quais se destaca o Instituto de Fármacos ( na UFPE) e o Instituto de Neurociências instalado na região metropolitana de Natal sob a liderança do cientista brasileiro Miguel Nicolelis que organizará uma verdadeira ?cidade da ciência?
num dos municípios mais pobres do RN ( Macaíba).

Igualmente importante foi quebrar o mito de que a agricultura familiar era inviável. O PRONAF mais que sextuplicou seus investimentos entre 2002 e 2010 e outros programas e instrumentos de política foram criados ( seguro ? safra , Programa de Compra de Alimentos, estimulo a compras locais pela Merenda Escolar, entre outros) e o recente Censo Agropecuário mostrou que a agropecuária de base familiar gera 3 em cada 4 empregos rurais do país e responde por quase 40% do valor da produção agrícola nacional.

E o Nordeste se beneficiou muito desta política, pois abriga 43% da população economicamente ativa do setor agrícola brasileiro.

Resultado: o Nordeste liderou o crescimento do emprego formal no país com 5,9% de crescimento ao ano entre 2003 e 2009, taxa superior a de 5,4% registrada para o Brasil como um todo, e aos 5,2% do Sudeste, segundo dados da RAIS.

Daí a ampla aprovação do Governo Lula em todos os Estados e nas diversas camadas da sociedade nordestina se refletir na acolhida a Dilma. Não é o voto da submissão – como antes – da desinformação, ou da ignorância. É o voto da auto- confiança recuperada, do
reconhecimento do correto direcionamento de políticas estratégicas e da esperança na consolidação de avanços alcançados – alguns ainda incipientes e outros insuficientes. É o voto na aposta de que o Nordeste não é só miséria (e, portanto, “Bolsa Família”), mas uma
região plena de potencialidades.

*Tânia Bacelar de Araujo é especialista em desenvolvimento regional, economista, socióloga e professora do Departamento de Economia da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
Carta Maior
Imagem:Quetrampo

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Países têm mais uma chance de preservar biodiversidade


Fabiano Ávila

A Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) foi um tratado firmado em 1992 no Rio de janeiro e que traçou uma série de metas com a intenção de conservar a biodiversidade e promover a distribuição justa e igualitária de seus recursos.

Praticamente nenhuma das 193 nações que assinaram o documento conseguiu cumprir os objetivos traçados.

Novas metas internacionais foram então firmadas em 2002 na África do Sul, com 2010 como o ano final para alcançar seus objetivos. Novamente nenhum país respeitou por completo o acordo o que resultou em outro fracasso.

“Devemos ter a coragem de olhar nos olhos de nossas crianças e admitir que falhamos, individualmente e coletivamente, para cumprir as promessas de reduzir as perdas da biodiversidade. ‘Os problemas da natureza sempre afetaram a vida humana. Hoje, infelizmente, a vida humana é o problema da natureza’ “, alertou Ahmed Djoghlaf, secretário-executivo da CDB, citando uma frase do famoso autor japonês Daisetsu Teitaro Suzuki.

O principal objetivo da COP 10 de Nagoya que começou nesta segunda-feira (18) será chegar a um consenso sobre o novo plano estratégico para a próxima década (2011-2020).

Este plano deve estabelecer metas para a conservação e uso sustentável da biodiversidade além de traçar políticas de longo prazo para 2050.

Os delegados terão ainda que buscar finalizar um protocolo de acesso e distribuição de benefícios (Access and Benefit-sharing - ABS) dos recursos genéticos do planeta.

A COP 10 também será marcada pela divulgação do relatório The Economics of Ecosystems and Biodiversity (TEEB) em sua versão integral, que irá mostrar que o impacto da perda de biodiversidade anualmente é da ordem de US$ 2 trilhões a até US$ 4,5 trilhões.

“Nós estamos destruindo as próprias fundações da vida neste planeta e mesmo assim a sociedade tem dificuldade de entender o que fazemos nessas reuniões e porque as decisões aqui realmente importam”, afirmou Achim Steiner, diretor-executivo do Programa da ONU para o Meio Ambiente.

Momento sem volta

Em maio a ONU publicou a terceira edição do o Global Biodiversity Outlook (GBO), que analisou mais de 110 estudos e diversos indicadores e mostrou, por exemplo, que a abundância de vertebrados, como mamíferos, pássaros e peixes, caiu um terço entre 1970 e 2006. O relatório também deixou claro como essas perdas e a degradação das florestas, corais, rios e outros ecossistemas já estão tendo impacto na vida das pessoas.

A ONG WWF reforçou essa mensagem na semana passada publicando o relatório “Living Planet Report”. O documento é uma das maiores auditorias já realizadas sobre a situação de quase oito mil populações de mais de 3500 espécies diferentes.

Ele contém descrições de como o atual padrão de consumo já resultou na perda de quase 60% da biodiversidade nos países mais pobres nos últimos 40 anos.

O WWF alerta que se os atuais padrões de crescimento e consumo persistirem serão necessários dois planetas Terra para suprir a demanda anual de toda a população mundial em 20 anos.

A Agência de Análise Ambiental dos Países Baixos (Netherlands Environmental Assessment Agency - PBL) também contribuiu para o debate trazendo para Nagoya o estudo “Rethinking Global Biodiversity Strategies”.

Nele, a agência mostra como o crescimento da população e do consumo irá criar uma pressão tão grande sobre os ecossistemas que as atuais políticas de proteção do meio ambiente através de reservas de conservação serão ineficientes para reduzir as perdas da biodiversidade. Por isso, tão importante que criar áreas de preservação é pensar em políticas que alterem a postura e os hábitos da população.

“Toda a vida na Terra existe graças aos benefícios da biodiversidade, como solo fértil, água potável e ar limpo. Nós agora estamos perto de um ponto crucial, se passarmos, as perdas da biodiversidade serão irreversíveis”, resumiu Ryo Matsumoto, ministro do Meio Ambiente japonês.

Para mostrar que ainda é possível reverter a situação crítica da biodiversidade, o Global Canopy Programme publicou na sexta-feira (15) o “The Litle Biodiversity Finance Book”, que apresenta análises sobre as opções de políticas e novas fontes de financiamento para auxiliar no cumprimento da meta de zerar a perda global de espécies.

Esse livro deixa claro que ainda podemos fazer muita coisa pela biodiversidade e que o tal momento sem volta pode sim ser evitado com esforços conjuntos dos diferentes fóruns de discussão.

(Instituto Carbono Brasil)

Carvão usado no Brasil incentiva desmatamento no Paraguai


Por Antônio Biondi e Marcel Gomes, do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis

Pesquisa revela que siderúrgicas e importadoras brasileiras compram cada vez mais carvão vegetal paraguaio sem necessariamente conhecer ou fiscalizar aspectos relacionados aos impactos ambientais, trabalhistas ou sociais.

Assunção (Paraguai) - No departamento paraguaio de San Pedro, a indústria do carvão vegetal está - literalmente - a pleno vapor. Matas cortadas, fornos de pequeno e médio porte à frente das casas dos agricultores locais, caminhões carregados de carvão, madeira jogada à beira da estrada esperando para ser recolhida. Ao lado do gado no pasto, um ipê-roxo solitário é o registro da vistosa mata que um dia existiu naquela paisagem. O desmatamento em grandes áreas é substituído pelas áreas desmatadas nas pequenas propriedades, adaptando-se aos novos tempos e leis do país.

Quem vê as modestas casas de moradores da área rural com estoques de carvão armazenados no terreno pensa, de imediato, em qual seria o destino de tal produção. E, ao mesmo tempo, reflete sobre o que motiva essa cadeia produtiva do carvão no Paraguai. Seria uma decorrência da situação de pobreza dos camponeses, aos quais faltam opções? Ou uma situação estimulada pelos países vizinhos, com destaque para o Brasil?

Entre os caminhões carregados que transitam pelas rodovias da região, há os que ostentam interessante pista: desenhos de bandeiras do Paraguai, Argentina e Brasil. E uma pesquisa nas importações de produtos paraguaios por empresas brasileiras revela que siderúrgicas no Brasil importam carvão paraguaio, sem conhecer ou fiscalizar praticamente qualquer aspecto - ambiental, trabalhista ou social - referente àquela produção.

Comunidades indígenas
Se a situação dos produtores familiares é preocupante, a dos indígenas é classificada como "bastante problemática" por Nicolas Benitez, líder indígena da Coordenação Interegional dos Povos Originais (Cirpo), que representa cerca de 20 comunidades em quatro departamentos do Paraguai (Canindeyú, Caaguazú, Guayra e Itapúa). Com problemas nas áreas de educação, saúde, terra, e enfrentando a contaminação de seus recursos naturais por agrotóxicos, os indígenas convivem com um aumento crescente de problemas, inclusive arrendando terras para as empresas do agronegócio. Algo que a lei não permite, mas ocorre na prática, segundo Benitez.

Os indígenas da região vendem sua pequena produção agrícola aos carros que passam na rodovia, buscando chamar a atenção com a colocação de abóboras e mandiocas à beira da estrada. Os filhos se aglomeram no quintal das pequenas casas de barro, enquanto os pais buscam comercializar a produção, sem usar o idioma espanhol - falam só o Guarani.

Uma abóbora média sai por R$ 2. Bem próximo dali, no acostamento da estrada, uma carga de madeira aguarda para ser retirada. Parece não pertencer a ninguém, mas certamente possui um portador que deve chegar a qualquer momento (preferencialmente à noite) para recolhê-la.

Nesse contexto, fica mais fácil compreender a explicação de Ladislau Bernardo, dirigente da Federação Nacional Campesina (FNC) no departamento de Canindeyú, De acordo com ele, "muitas vezes, a produção de carvão acaba sendo a única fonte de riqueza dos camponeses". Uma situação tão dramática que, quando as autoridades cogitaram proibir a produção e comercialização do carvão vegetal na região, tiveram como resposta um levante dos camponeses e indígenas da região. Diante da revolta, as autoridades recuaram. E a produção local "continua a ir para o Brasil e para algumas indústrias no Paraguai", segundo o dirigente camponês, em entrevista concedida na rodoviária de Curuguaty, no departamento de San Pedro.

Siderúrgicas brasileiras
O Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) apurou que parte do carvão produzido no Paraguai é, de fato, comprado por siderúrgicas brasileiras, sobretudo aquelas localizadas em Minas Gerais, para servir de matéria-prima e combustível em fornos de ferro-gusa. O material também é trazido por pequenas importadoras, que depois repassam para as próprias siderúrgicas ou para restaurantes, onde são usados em churrasqueiras.

Entre janeiro e junho de 2010, o Brasil importou 66 mil toneladas de carvão e produtos equivalentes do Paraguai, alta de 120% em relação ao mesmo período de 2009. A movimentação financeira chegou a US$ 5,3 milhões, a décima-primeira categoria de produtos em volume financeiro. De acordo com um comprador de carvão de uma siderúrgica mineira, o volume importado poderia ser até três vezes maior, não fosse a crise por que passam algumas fabricantes de ferro-gusa. Voltadas à exportação, algumas mantêm os fornos desligados desde 2008, ano de início da crise internacional.

Grandes siderúrgicas brasileiras compraram carvão vegetal no Paraguai. É o caso, por exemplo, da Gerdau, uma das maiores do mundo. Questionada sobre a exigência de parâmetros socioambientais dos fornecedores que fazem parte de sua cadeia produtiva, a empresa afirmou: "A Gerdau esclarece que realizou importações pontuais de carvão vegetal do Paraguai, seguindo rigorosamente a legislação ambiental vigente. A última importação do produto do Paraguai foi realizada em 2008 pela empresa".

O carvão também é adquirido por siderúrgicas como Mat-Prima e Valinho, ambas de Divinópolis (MG); Cisam, de Pará de Minas (MG); e Ferguminas, de Itaúna (MG). Já grande parte das pequenas importadoras ficam nos municípios de Ponta Porã (MS), que faz divisa com a cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, e nos municípios de Novo Mundo (MS) e Guaíra (PR), ambos na divisa com a cidade paraguaia de Salto del Guairá.

Criada em 1993, a Mat-Prima tem capacidade de produzir 12 mil toneladas de produtos siderúrgicos por mês. A maior parte é exportada pelos portos do Rio de Janeiro (RJ) e de Vitória (ES). A empresa compra o produto paraguaio por meio de pequenas importadoras e também usa combustível brasileiro fabricado nos Estados de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. No caso do produto paraguaio, a Mat-Prima avalia que qualquer controle ambiental é de responsabilidade do produtor e da empresa importadora.

Também fabricante de ferro-gusa, a siderúrgica Cisam opera com carvão vegetal produzido no Brasil e no Paraguai. De acordo com um representante da empresa, o carvão é totalmente produzido com madeira oriunda de florestas plantadas, inclusive os carregamentos oriundos do Paraguai. A área de reflorestamento localizada no Paraguai foi implantada na cidade de San Juan Nepomuceno, no departamento de Caazapá, e é um empreendimento comandado por brasileiros. Já as siderúrgicas Ferguminas e Valinho estão com os fornos desligados, à espera da recuperação do mercado. Quando estão em funcionamento, as duas empresas utilizam carvão oriundo do Paraguai.

Tráfico e contrabando
Além dos problemas ambientais, sociais e trabalhistas que se escondem atrás do carvão paraguaio, traficantes de drogas e contrabandistas se valem do fluxo mercantil para introduzir produtos ilegais no Brasil. De acordo com fonte que consultada pela reportagem (cuja identidade será preservada), "o carvão é um convite para esse tipo de atividade, pois bloqueia o scanner [espécie de raio-x] utilizado na fiscalização de fronteira".

Além disso, o carvão "prejudica o olfato dos cachorros, é sujo e absorve o cheiro dos materiais". Até alguns anos atrás, o carvão paraguaio entrava quase sem impostos no Brasil. O preço era muito baixo: um caminhão carregado custava algo em torno de R$ 1 mil. Após muitos conflitos para que o preço do carvão importado fosse aumentado, a tonelada, que entrava no Brasil por cerca de US$ 20 dólares, agora está em torno de US$ 100.

José Alberto Iegas, chefe da delegacia da Polícia Federal (PF) na cidade fronteiriça de Foz do Iguaçu (PR), explica que é difícil estabelecer uma relação direta entre uma eventual carga ilegal de drogas ou contrabando com algum produtor de soja, de carvão ou de qualquer outro produto do Paraguai. "O mais comum é o dono do produto principal nem saber que a carga estava com a droga, sendo que nesses casos normalmente o motorista é cooptado pelo esquema diretamente. Mas acontece também do traficante comprar a carga e misturar, fazendo o serviço completo".

Ele acrescenta que os flagrantes desse tipo ocorrem normalmente em função de denúncias, investigações, pelo perfil da carga, ou pelo perfil da documentação. Segundo o chefe da PF, embora seja complicado de se apontar a relação direta entre o produto ilegal e algum produtor, é certo, por outro lado, que "os grandes traficantes normalmente possuem várias atividades legais para a lavagem do dinheiro da droga, do contrabando, inclusive pela compra de propriedades rurais, ou por meio de investimentos no gado".

Em Ponta Porã (MS), a assessoria de imprensa da PF afirma que flagrantes de droga e carga contrabandeada dentro dos carregamentos de carvão e de soja são comuns. Conforme a assessoria, trata-se de um subterfúgio muito usado pelos traficantes da região, sendo que em uma ocasião recente, foi encontrada uma carga de 11,7 toneladas de maconha em um caminhão de soja. De acordo com setor aduaneiro da PF em Foz do Iguaçu (PR), não é só com soja que se verifica a situação de contrabando e tráfico de drogas, mas também com o feijão, o milho, entre outros.
(Envolverde/Repórter Brasil)

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Fórum SocialPanAmazônico



I Encontro dos Povos e Comunidades Atingidas e Ameaçadas por grandes projetos de infra-estrutura, nas bacias dos rios da Amazônia: Madeira, Tapajós, Tele Pires e Xingu.


Em preparação ao V Fórum Social Pan-Amazonico, vai acontecer o encontro dos 4 rios, Madeira, Teles Pires, Tapajós e Xingu. Que será debatido num dos eixos temáticos do fórum em novembro em Santarém.

Os planos de construção de hidroelétricas são decididos em Brasília e empurrados sem diálogo nas populações amazônicas. Para o governo federal e seu Ministério de Minas e Energia e Eletronorte, nós somos descartáveis, obstáculos ao crescimento econômico.

Convocamos a todos e todas para que juntos, façamos ecoar para todo o Planeta, começando pela cidade de Itaituba, que os Povos e Comunidades da Pan-Amazônia, que estão pagando com suas vidas pela chamada integração econômica forçada, promovida pela IIRSA – Iniciativa de Integração da América do Sul e o PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, do governo brasileiro, é simplesmente a submissão do atual governo às metas do IIRSA, projetos estes que não promovem a “integração” dos povos e comunidades, mas ao contrário, desintegra-os, a exemplo do que está acontecendo com os povos e comunidades no Complexo Madeira, Interoceânica e Complexo Xingu, e que caso não impeçamos, pode vir a acontecer também na Bacia do Rio Tapajós/Jamanxin.

Visite a página do encontro

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Paris Hilton e Miguel Nicolelis (Ou o que somos e o que poderíamos ser)


Por Reinaldo Canto*

Um país sem educação vai além de problemas com mão de obra qualificada. Essa lacuna empobrece e fragiliza a sociedade e o país. A educação contribui para a formação de seres pensantes e cidadãos mais preparados e menos manipuláveis. A educação também colabora decisivamente para disseminar valores como respeito, conhecimento, solidariedade, tolerância e ética.

Nos últimos dias, dois fatos diametralmente opostos por sua importância e relevância, me chamaram a atenção e aqui reproduzo:

1 - O neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, que trabalha no Departamento de Neurobiologia da Universidade Duke, Carolina do Norte (EUA), foi um dos escolhidos para receber o Transformative R01 Award dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos. O prêmio dá direito a um financiamento para pesquisas de aproximadamente US$ 4 milhões (quase R$ 7 milhões).

Ele já havia recebido em julho o Pioneer Award, criado pela mesma instituição em 2004, pelo qual recebeu US$ 2,5 milhões (R$ 4,3 milhões aproximadamente) para dar continuidade a suas pesquisas no campo da interface cérebro-máquina. Nicolelis é o primeiro cientista no mundo a receber da instituição americana no mesmo ano o Pioneer e o Transformative R01.

Nicolelis é, além de um cientista renomado, um homem preocupado com o desenvolvimento do Brasil. Por essa razão, montou o Instituto Internacional de Neurociências de Natal, um centro de excelência em neurociência, no estado do Rio Grande do Norte. Jovens da região, graças ao empenho de Miguel Nicolelis, estudam no local e os que se destacam tem a oportunidade de trabalhar no Instituto.

2 – A socialite internacional Paris Hilton, herdeira de uma fortuna, conhecida pela gravação de um filme pornô e excessos variados, foi considerada culpada por uma corte nos Estados Unidos por porte de cocaína e ficará em liberdade condicional por um ano. Ao mesmo tempo ela é cortejada em nossas terras vem ao Brasil para gravar comerciais e ser garota-propaganda de uma grande cervejaria nacional recebendo um bom dinheiro por isso.

Esses fatos que nada tem em comum, causam reações bastante diferentes. Por essa razão, tracei cenários distintos, ou seja, o da nossa triste realidade e outro para um país ideal, no qual a educação seja vista como prioridade por todos os setores.

Cenas do país real:

Miguel Nicolelis 1

Pequenas matérias de portais de internet e notas de rodapé em páginas internas de jornais relatam a premiação de um dos maiores e mais engajados cientistas brasileiros. As revistas de celebridades não falam do assunto, pois fatos e "gente sem importância" não entram nas suas páginas.

Na noite seguinte ao recebimento do novo prêmio Nicolelis é visto em um restaurante movimentado em São Paulo com a família e um pequeno grupo de amigos comemorando o feito. Não foi interpelado por ninguém, algumas pessoas comentam em desaprovação o fato de naquele restaurante da elite paulista, aquele "desconhecido" trajar uma camiseta do Palmeiras, time do coração do cientista.

Paris Hilton 1

Tanto a condenação quanto a vinda ao país recebem grande cobertura. Fotos e imagens da musa são reproduzidas em diversas mídias, com grande destaque dos veículos de fofocas e celebridades. Paris recebe muitos convites para participar de programas de televisão, de inúmeras festas e eventos sociais. Por onde passa é cercada de fotógrafos, cinegrafistas e populares que se aglomeram reverenciando o vazio e a futilidade. Seguranças são contratados para evitar o assédio e a histeria de jovens que a vêem como um ídolo.

Num outro país, aquele ideal que mencionei, as duas personagens seriam tratadas de outra maneira:

Miguel Nicolelis 2

O cientista é capa de todos os jornais e portais de notícias brasileiros. Matérias descrevem o trabalho e esforço de Nicolelis para criar centro de excelência científica no Nordeste do país. Outras notícias falam dos projetos sociais e de formação de jovens carentes para trabalhar com ciência. A imprensa esportiva ressalta que o grande cientista é palmeirense fanático e já usou o futebol até em artigos científicos. Em entrevista coletiva Nicolelis falou dos seus projetos e na confiança que tem no futuro do país.

Nicolelis é aplaudido de pé ao entrar em restaurante da capital paulista para jantar ao lado de amigos e familiares. Mais cedo em jogo do Palmeiras, é homenageado pelos jogadores e torcedores do seu time. Antes de se iniciar a partida, aliás vencida por seu time, ouviu-se no estádio: Uhhh Nicolelis, uhhh Nicolelis.

Paris Hilton 2

A socialite vem ao Rio de Janeiro para descansar após a condenação. Apenas um jornal registra o fato, mesmo assim por acidente. É que um repórter foi ao aeroporto entrevistar Miguel Nicolelis e perdeu a viagem (o cientista teve que cancelar a sua ida ao Rio em função de outros compromissos). Por essa razão, o jornalista registra a chegada da moça numa simples notinha de rodapé.
No trajeto do aeroporto ao hotel, a jovem não é importunada. Ninguém nota a sua presença, além dos homens que tem predileção por loiras. E as revistas de fofoca e celebridades? Nesse meu país ideal, elas simplesmente não existiriam.

Bem, um país assim está bem distante de se tornar realidade, mas como faz bem sonhar!

Aos dois personagens aqui descritos fica a minha saudação:

Parabéns e muito obrigado Nicolelis!!

Paris... ahh... deixa pra lá!!

FOTO
Legenda: Miguel Nicolelis
(Envolverde/O autor)

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A “comunicação pelo cuidar” é a comunicação para a sustentabilidade


Por Luiz Antônio Gaulia*, da Plurale

Para que servem os indicadores criados pela Global Reporting Initiative - GRI? Para acompanhar o desempenho organizacional em suas dimensões econômicas, sociais e ambientais que moldam o tripé da sustentabilidade.

Indicadores e suas formas de gestão são maneiras de prestar atenção e “cuidar” das relações entre diferentes dimensões. Este cuidar, numa percepção integral da vida, no meu entender, seria uma forma de comunicar.

A comunicação pelo cuidar, portanto, é uma comunicação que nos convoca para uma mudança de postura: baseada no respeito à vida. Uma ponte abrangendo a economia, o meio ambiente, os sistemas sociais, culturais, nossas emoções e afetos, nosso modo de conversar, interagir, pensar, perceber conexões essenciais e ainda, a nossa própria transcendência (espiritualidade).

Ao entenderemos a sustentabilidade como a construção do “nosso futuro comum” – como já definiu o Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, organizado por Gro Harlem Brundtland, em 1988, compreendemos necessariamente o valor do cuidado. O saber cuidar é saber comunicar, uma vez que seria impossível cuidar sem relacionar-se, sem envolver-se. Uma vez que o cuidado requer proximidade, requer afeto e consciência em cada atitude. O cuidar é a mais bela e nobre forma de comunicação existente.

A comunicação pelo cuidar não precisa de discursos, manifestos ou publicações. Ela é uma ação comum, prática verdadeiramente sustentável a favor da “teia da Vida”, da qual falou o físico Fritjof Capra.

Numa ótica humanística essa comunicação pelo cuidado é um novo jeito de trabalhar, de conviver, de partilhar. De engajamento na construção de novos pontos de encontro entre culturas variadas, entre visões de mundo aparentemente opostas. Entre a pluralidade que pode causar estranhamento, mas que é a riqueza que permitiu a vida no planeta. Numa dinâmica comunicacional fantástica, miríade de possibilidades, articulações.

Por isso, o cuidar como base. Como primeiro degrau na direção de um amanhã onde a vida terá a preferência sobre as coisas, nunca mais sendo tratada como coisa. Onde a vida terá preferência sobre as máquinas, a produção e o crescimento a qualquer custo. Sem uma merecida atenção aos detalhes, ao pequeno, ao que parece inútil. Porque tudo que é vivo merece cuidado. Naquilo que deveria ser o olhar sem fronteiras que a sustentabilidade nos demanda. Para percebermos os nodos de uma rede de intensa relação: interdependente e intercambiante.

Dessa forma, o cuidar é a tradução, em permanente movimento, desta nova forma de ser e viver. Olhando o mundo além de si, além do imediato. Olhando o outro ser humano e os outros seres vivos, bem como os ecossistemas – nossos patrimônios coletivos, não como mercadorias ou peças soltas, fragmentadas, descartáveis e consumíveis numa voracidade veloz e agressiva. Mas com o olhar do cuidado. Através da comunicação pelo cuidar.

Do ponto de vista da política tal proposta resgataria o conceito de Democracia: pessoas ultrapassando seus interesses imediatos “sendo capazes de reconhecer os interesses dos outros e pensar o interesse do conjunto da sociedade” (citando Cristóvão Buarque). Pensar cada sociedade como inseparável do meio ambiente, buscando a preservação da vida em condições melhores do que as de hoje, como um legado às futuras gerações.
Garantir esta herança seria comunicar para as próximas gerações exatamente a importância do cuidado. Afinal, não precisamos, como escreveu o filósofo Ralph W. Emerson, “começar a aprender geologia na manhã seguinte a um terremoto”. Temos escolhas a serem feitas e a opção pela sustentabilidade é uma delas. E a comunicação para a sustentabilidade, a comunicação pelo cuidar é a construção dessa estrada, via de acesso da nossa sobrevivência.

Porque visão de longo prazo é saber que o dia de hoje carrega em si a semente do amanhã: “somente quando imaginamos o futuro como projeção de aspirações do presente é que o tempo atual passa a ser percebido como o momento de gestação do amanhã” (conforme escreveram Sandra Korman Dib e Elaine Juncken Teixeira em trabalho a respeito da ação sobre o próprio destino e o destino comum).

Fundamental, assim resgatar a relevância da palavra como cuidado. Da palavra como afeto, verdadeira energia fraterna, fazedora de laços, fortalecedora da confiança e de tolerância. Onde a comunicação, mais do simples lâmpada, é a própria luz. Trilha sobre o que antes estava invisível, esquecido, imperceptível, mal cuidado. Daí, o necessário diálogo - como escreve David Bohm, ser fundamental uma vez que “nossas relações dependem de como apresentamos os outros a nós mesmos e vice-versa. E tudo isso depende das representações coletivas.” Imaginemos então a conversa entre a humanidade como a mais ampla forma da comunicação pelo cuidado, como o encontro de “uma família que ainda não se conhece” (Theodor Zeldin).

O construir de uma biocivilização a partir de nossa própria vizinhança. Dos nossos arredores mais provincianos para o global, como pixels de uma fotografia maior. E para que tal empreitada se realize, vamos precisar “de todo mundo” como já cantou o poeta Beto Guedes, porque o “caminho entre o possível e a utopia é o espaço no qual os cidadãos do mundo podem e devem agir” (Jean Pierre Leroy).

O que já nos exige modelos educacionais capazes de “contextualizar os saberes e integralizá-los em seus conjuntos” como defende Edgard Morin. Porque o cuidar para ser sustentável requer a compreensão do todo, a percepção sistêmica de nossas ações e reações, de conseqüências aparentemente isoladas, do entendimento de contextos, leitura de cenários numa linha de tempo e de fatos que se sempre se interligam. Entre razão e emoção. Causa e consequência.

Como na questão, por exemplo, dos Direitos Humanos - outro aspecto abordado pelo modelo da GRI: “Quando alguém é injustiçado, toda a humanidade paga o preço” (segundo Francisco Gomes de Matos em “A Empresa com Alma”). Ou ainda diante de um acidente de trabalho com vítimas fatais numa obra e também diante de falhas de processos técnicos, resultando em desastres ambientais que desconhecem fronteiras políticas – como recentemente aconteceu com a explosão da plataforma de petróleo da BP no Golfo do México. E também testemunhando os incêndios gigantescos nos arredores de Moscou, na Rússia: a natureza desconhece as diretrizes traçadas pela arrogância dos homens.

* Luiz Antônio Gaulia é Jornalista, publicitário, professor da ESPM (em Comunicação & Desenvolvimento e Gestão de Crise & Assessoria de Comunicação) e da ABERJE (em Comunicação Interna como Ferramenta de Gestão). Trabalhou em projetos de comunicação para a sustentabilidade junto à empresas como Votorantim, Natura, Vale e Light entre outras.
(Envolverde/Plurale)

Novas estratégias para a defesa da biodiversidade

Fabiano Ávila, do Instituto CarbonoBrasil/PBL

O crescimento da população e do consumo irá criar uma pressão tão grande sobre os ecossistemas que as atuais políticas de proteção do meio ambiente através de reservas de conservação serão ineficientes para reduzir as perdas da biodiversidade.

Esta é a principal conclusão do estudo “Rethinking Global Biodiversity Strategies“, produzido pela Agência de Análise Ambiental dos Países Baixos (Netherlands Environmental Assessment Agency - PBL) para ser apresentado durante a próxima Conferência das Partes (COP 10) da Convenção sobre Diversidade Biológica, que será realizada em Nagoya, no Japão, entre 18 e 29 de outubro.

Segundo a PBL a única maneira de frear de forma consistente a perda da biodiversidade é fazendo uma mudança estrutural no nosso modelo de produção e consumo, mesmo que para isso sejam necessárias leis severas limitando a pesca, a expansão da pecuária e determinando a alteração do uso da terra.

O estudo alerta que já teriam sido tentadas leis pontuais em alguns setores, mas que é necessário o trabalho conjunto dos governos para que normas internacionais possam ser adotadas nos mais diversos modelos de negócios. Com isso seria possível reduzir pela metade a perda da biodiversidade projetada para 2050.

Medidas

Boa parte das propostas da PBL passa pela modernização dos métodos de produção de alimentos, com os países mais ricos ajudando os mais pobres com financiamentos e transferência de tecnologia.

Para a agência existe um grande potencial em tornar mais eficientes as lavouras ao redor do mundo, o que evitaria a destruição de milhões de hectares de matas nativas para a expansão dessa atividade. O mesmo pode ser aplicado para a pesca.

Já para a pecuária, além da modernização, o estudo aconselha campanhas para reduzir o consumo de carne. Será um desastre ambiental se o crescimento populacional for acompanhado pelas atuais taxas de consumo e a única maneira de evitar isso seria começar desde já a mobilização pela mudança dos hábitos alimentares, afirma a PBL.

Existe também grande espaço para aprimoramentos na indústria madeireira, com a aplicação de melhores técnicas de plantio e aproveitamento. A consolidação de selos e certificados de procedência será apresentada na COP 10 como uma das melhores alternativas para o setor.

Finalmente, a PBL recomenda uma maior integração com as políticas climáticas e suas potenciais ferramentas. Unir a proteção da biodiversidade com o combate ao aquecimento global será fundamental para a sociedade superar os dois desafios.

O estudo possui 172 páginas com tabelas e gráficos detalhando cada uma das possibilidades e explicando as conseqüências que sofreremos se não fizermos nada para evitar a perda das espécies.

É a biodiversidade que nos garante solos férteis, água limpa e ar de qualidade. Esses serviços são hoje nos fornecidos gratuitamente, mas se continuarmos ignorando os danos que provocamos ao meio ambiente os prejuízos econômicos e sociais serão grandes demais para sequer serem calculados.

(Instituto Carbono Brasil)

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Rede de Educação Ambiental realiza amanhã seu VI encontro

“Que a REMTEA consiga sentir o essencial com seus participantes deste VI Encontro, e exaltar mais uma oportunidade de celebrarmos, coletivamente, a esperança! Não seria isso o que realmente importa?” Com estas palavras, a professora Drª Michèle Sato encerra a apresentação do caderno de resumos do VI Encontro da Rede Mato-Grossense de Educação Ambiental (REMTEA), que começa amanhã e segue até sexta-feira (06 a 08), com a presença de mais de 700 participantes. A abertura oficial será no Centro Cultural da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), às 18h, com palestra de Michèle Sato e do professor Dr. Luiz Augusto Passos, ambos da UFMT.

Sendo um evento, também, acadêmico, o VI Remtea oferece a oportunidade de conhecer um pouco o que está sendo feito e produzido nos espaços escolares e comunitários, na educação escolarizada e na popular; em “Mato Grosso e para fora dele, até nos territórios longínquos onde a vista nem alcança.”, como diz Michèle. Ao todo, foram inscritos 252 trabalhos no formato resumo simples e resumo expandido, sendo que 198 foram aprovados.

O encontro é um momento altamente significativo para estudantes, pesquisadores e militantes de Educação Ambiental, uma vez que possibilita, também, o contato presencial dos mais de 300 participantes da rede, que comumente se comunicam via Internet. Embora pareça não haver muito para ser comemorado, a Remtea, segundo a professora, é um espaço de militância onde a “duras penas aprendemos a fazer mobilização social, a escrever e a assinar políticas públicas participativas”.
Em função do seu caráter agregador, o encontro da rede de Educação Ambiental vem crescendo com o desenvolvimento de eventos satélites no seu entorno. Este ano, serão três: “II Seminário de Mapeamento Social de Mato Grosso”, que reúne um número significativo de grupos sociais do território mato-grossense; o “I Encontro das Juventudes Mato-Grossenses” e o “III Encontro da Educação Ambiental Escolarizada”.

Centrado no tema “Territórios e Identidades”, o encontro da Remtea tem na sua programação três conferências alusivas a esta temática: “Territorialidades e identidades nos movimentos de resistência” com o professor Carlos Walter Porto-Gonçalves (UFF, Rio de Janeiro, RJ) e Regina Aparecida da Silva (GPEA, UFMT); “Diversidade nos Territórios”, com Diosmar Filho (INGÁ, Salvador, BA) e Gilberto Vieira dos Santos (CIMI/MT); e “Territórios identidades e temporalidades” com o professor Rogério Haesbaert (UFRJ, Rio de Janeiro, RJ) e Marcos Sorrentino (Esalq, Piracicaba, SP) .

Contam também na programação do evento mesas provocativas, painéis e eventos culturais. Confira a programação completa do
VI REMTEA

E o verde violentou as urnas!

Por Dal Marcondes, da Envolverde

Marina Silva teve 20% dos votos no Brasil. Isso significa que 20 milhões de brasileiros querem, e demonstraram isso nas urnas, que a sustentabilidade não seja mais um tema de oportunidade. Desejam que isso realmente seja incorporado a políticas públicas e de governo. Mais, estes eleitores deixaram uma mensagem clara para os dois candidatos que vão ao segundo turno: é preciso discutir o Brasil de forma mais consistente e não na base do generalismo. Todas as promessas são sobre educação, saúde, segurança etc. Temas sobre os quais há certezas. Ou seja, quem em sã consciência é contra agua encanada e esgoto tratado? Os eleitores de Marina, que vão decidir esta eleição, querem saber como será o desenvolvimento do Brasil nos próximos quatro anos. Que modelo de país o futuro governo quer e vai entregar. Uma discussão que estava descartada até este momento e que será o que realmente importa.

Bom, mas o processo eleitoral teve outras surpresas, principalmente em relação à disputa pelas duas vagas ao Senado em São Paulo. Aluízio Nunes, do PSDB, era quanse uma “carta fora do baralho” pelos dados dos institutos de pesquisa. Liderou a eleição. Ricardo Young, do PV, nunca era apontado com mais do que 2% das intenções de votos. Chegou a 4.117.634 votos, o que significa 11,20% dos votos dos paulistas. Vale perguntar como são feitas estas pesquisas, que deturpam resultados e atrapalham as campanhas mais do que bocas de urna e outras práticas que o Tribunal Eleitoral já pune como crimes. A divulgação de pesquisas erradas, que se afirmam “científicas” e com margens de erro de dois pontos para mais ou para menos influi na decisão de muitos eleitores. No entanto, de 2% para 11% não é exatamente uma “margem de erro”, mas sim incompetência na melhor das hipóteses, e má fé criminosa na pior.

O que vamos assistir agora são explicações mal ajambradas de porque se errou tanto e pedidos de desculpas aos eleitores, como se o estrago não tivesse nenhuma consequência. Em uma campanha política a possibilidade de vitória tem muitos reflexos na ação e na captação de recursos. Um candidato com 2% dos votos não estimula muitos doadores a apoiarem sua campanha. Um candidato que, no entanto, mostra sua capacidade, ou seu cacife eleitoral, pode conseguir mais apoios e, com isso, lutar para conquistar os votos que ainda necessita. Ricardo Young ultrapassou 4 milhões de votos, e poderia ter ido mais longe se tivesse recursos. Sua campanha se pautou pela austeridade e pela qualidade de suas propostas. Não teve os recursos dos quais dispuseram a maioria de seus adversários, mas mostrou que a sociedade é capaz de compreender propostas elaboradas de políticas públicas, apesar da incapacidade de diversos meios de comunicação e jornalistas em acreditar nisso.

Dilma e Serra terão de beber nas propostas de Marina, Ricardo e outros candidatos verdes se quiserem os votos destes eleitores. Não são os mesmos que votaram em Tiririca, não podem ser conquistados com promessas vagas e querem saber não apenas o que os candidatos vão fazer depois de eleitos. Principalmente querem saber COMO vão fazer. Este segundo turno fará bem ao Brasil. A política terá de ser feita de forma diferente, dialogada, negociada em termos de políticas públicas e não nos tradicionais acordos de bastidores e conchavos.

Para Marina Silva, a sustentabilidade não é mais assunto de guetos e as urnas provaram isso. E sustentabilidade pressupõe ética, transparência, governança, equilíbrio social, ambienta e econômico, além de um dos mais importantes valores dos ambientalistas, o princípio da precaução frente a arrogância do determinismo tecnicista.

(Envolverde)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A vitória do meio ambiente nestas eleições



Não poderia deixar de falar do contentamento que sinto com o resultado desta eleição para presidência, considerando o atual cenário, é claro! Os quase 20% de votos dados para Marina significa que ela está em condições de negociar uma pauta ambiental no próximo Governo. Por ironia do destino, Dilma, que afinal foi a tromba d’água que motivou a saída de Marina do Ministério do Meio Ambiente, vai ter de baixar o narizinho e pedir votos para Marina, porque sem dar a devida importância para a pauta ambiental, ela não ganha estes votos. Pelo menos não o meu! Afinal, votei na Marina porque ela representa o meio ambiente e uma política mais ética. Pelo menos este é o seu discurso e preciso apostar em alguém, embora não tenha esquecido o quanto ela cedeu ou teve que ceder no governo Lula em questões ambientais cruciais.

Tudo bem que o governo PT trouxe ganhos sociais como nunca vistos neste País, mas também fez alianças vergonhosas e é um grande aliado do agronegócio que tratora nossas florestas impiedosamente e é responsável pela maior parte das nossas emissões de carbono. Mas, ainda assim, como não temos grandes opções, sou a favor de uma aliança da Marina como o PT, desde que a agenda ambiental seja devidamente respeitada e quem sabe Marina indique ou vai para o Ministério do Meio Ambiente, desta vez conduzida por Dilma...

Resta saber se o PT vai, finalmente, esverdear um pouco e trocar o já surrado discurso desenvolvimentista por um discurso pautado em sociedades sustentáveis, com justiça e equidade social, mas também com sustentabilidade ambiental, assegurando nossa biodiversidade, segurança alimentar e muitos etceteras e tal de um discurso que é muito bom, mas que parece impossível ser alcançado a tempo...

É, não vai ser fácil engolir essa e acreditar que Dilma vai respeitar algum Ministério de Meio Ambiente. Deveria existir algum tipo de garantia para o eleitor, mas, infelizmente, não é assim que acontece. Mas sem acordo, Dilma não ganha meu voto!
Liete Alves

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Pense em quem você vai votar
Amazônia perde 210 km² de floresta em agosto


De acordo com o Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), em agosto foram desmatados 210 quilômetros quadrados de floresta na Amazônia Legal. A maioria (68%) da devastação ocorreu no Pará, seguido por Mato Grosso (11%), Amazonas (10%), Acre (6%) e Rondônia (5%).

A quantidade de área desflorestada nesse mês representa, segundo o instituto, uma queda de 23% em relação a agosto de 2009 quando o desmatamento somou 273 quilômetros quadrados.

O Pará foi o Estado que mais reduziu o desmatamento (-31%), seguido de Rondônia (- 24%). Por outro lado, houve aumento no desmatamento no Acre, Amazonas e Mato Grosso.

Degradação

Além do desmatamento, o SAD detectou no período 1.549 quilômetros quadrados de florestas degradadas. “Isso corresponde ao aumento expressivo de 241% em relação ao mesmo mês do ano anterior (agosto de 2009) quando a degradação florestal atingiu 455 quilômetros quadrados. Desse total, 46% ocorreu em Mato Grosso, 38% no Pará, 12% em Rondônia, 3% no Amazonas e 1% no Acre.”, diz o estudo.

Em relação às florestas degradadas, o aumento comparado ao mesmo mês de 2009 foi extremamente expressivo no Amazonas (+ 1.651%) e Acre (+ 1.029) e significativo no Pará (+ 282%), Rondônia (+ 210%) e em Mato Grosso (+ 192%).

Carbono

Segundo o instituto, a devastação detectada em agosto deste ano na Amazônia Legal comprometeu 3,4 milhões de toneladas (com margem de erro de 1,3 milhões de toneladas) de carbono. Essa quantidade de carbono afetada resulta em 12,5 milhões de toneladas de CO equivalente.

BR 163 e devastação

Em agosto de 2010, o desmatamento se concentrou de maneira mais expressiva no Pará principalmente na área de influência da BR-163 (rodovia Santarém-Cuiabá) afetando os municípios de Novo Progresso, Altamira, Trairão e Itaituba; e na Terra do Meio, atingindo os municípios de São Félix do Xingu e Altamira. Houve também desmatamento mais concentrado em Porto Velho (Rondônia) e Rio Branco (Acre).

Em relação a situação fundiária, em agosto de 2010, a maioria (54%) do desmatamento ocorreu em áreas privadas ou sob diversos estágios de posse.

Veja o documento na íntegra:


Boletim Transparência Florestal - Agosto de 2010


(Amazônia.org.br)