sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Dois acordos para o clima

Secretário-geral da COP-15 diz que Kioto poderia ser ampliado

Deborah Berlinck e Roberta Jansen escrevem para "O Globo":

A Conferência de Clima da ONU (COP-15), em Copenhague, poderá ter dois documentos finais em vez de apenas um, segundo afirmou nesta quinta-feira (10/12) o secretário-executivo da cúpula, Yvo de Boer, em entrevista exclusiva ao "Globo".

Um deles seria uma extensão do Protocolo de Kioto, com metas de redução para os países ricos e de ações de mitigação para as nações em desenvolvimento, aceito por todos e com valor legal. O outro seria um tratado totalmente novo, feito com base na Convenção do Clima, com o objetivo específico de abarcar os Estados Unidos, que não ratificaram Kioto.

Um consenso sobre os documentos, segundo de Boer, ainda não foi alcançado, mas, para ele, este será o desfecho mais provável do encontro.

Leia a entrevista:

- O senhor disse que há um consenso de que Copenhague terá que produzir um documento legalmente vinculante (acordado por todos os países e com valor legal). Mas como convencer os EUA a participarem?

Há consenso que um acordo tem que ser juridicamente vinculante, mas países têm definições diferentes sobre o que isso quer dizer. Todos concordam que um segundo período de compromissos do Protocolo de Kioto seria legalmente vinculante; uma grande maioria quer que este encontro resulte numa prorrogação de Kioto. Mas também são muitos os que acham que é preciso um outro tratado, um novo instrumento legal.

- Os EUA querem um segundo tratado, não?

Sim. Mas muitos negociadores falam em adotar um passo intermediário, em que seriam tomadas decisões sobre metas (de redução de emissões) e ações (de mitigação) a serem adotadas pelos principais países em desenvolvimento, decisões sobre financiamento, criação de novos órgãos para financiamento e de transferência de tecnologia, decisões para lançamento de novos programas para adaptação.

E, em 2010, estas decisões seriam oficialmente transformadas num tratado.

- É a saída para trazer os EUA para um tratado?

Sim, incluiríamos os EUA, num acordo sob a convenção. E, ao mesmo tempo, continuaríamos com Kioto. Lembre-se que Kioto já existe e é o único instrumento legal que temos. Um novo instrumento legal sob a convenção teria que ser desenvolvido, acordado, ratificado e ainda entrar em vigor (Kioto levou oito anos para entrar em vigor). Portanto, para muitos países, é muito importante que o Protocolo de Kioto seja mantido para termos continuidade e uma base legal, enquanto este novo instrumento está sendo construído.

- Como seria um instrumento legalmente vinculante sob a Convenção do Clima? Como os EUA podem ter metas que sejam legais?

Vejo um tratado sob a convenção tendo uma lista de metas. A questão é: essas metas serão legalmente vinculantes internacionalmente ou domesticamente? O que os EUA dizem é que, se assumirem uma meta num novo tratado, eles a transformariam em lei nacional.

- É possível fazer países em desenvolvimento, como a China, assumirem metas neste novo tratado da convenção?

China e outros países em desenvolvimento dizem que não querem compromissos com metas, mas com ações. Mas os países em desenvolvimento também dizem que transformarão suas ações em leis.

A primeira questão, então, é: (o novo tratado) vai ser legalmente vinculante no plano internacional ou doméstico? Ou vamos ter níveis diferentes de vinculação legal? E é isso que precisa ser decidido na próxima semana.

- Teríamos dois acordos: um novo tratado, com os EUA e metas; e outro de prorrogação de Kioto?

Correto. Temos que ter acordos paralelos, se não a COP-15 fracassará. Se, com o tempo, estes dois processos vão convergir, isso ainda vamos ver. Vocês estão me perguntando o que vai acontecer em 2020. Eu não sei nem o que vai acontecer até sexta-feira.

- Quais os pontos mais difíceis?

Vejo dois pontos difíceis. O primeiro é que as metas dos países desenvolvidos não são suficientemente ambiciosas. O segundo é dinheiro, a curto e a longo prazo.

- Qual seria um montante mínimo aceitável?

Se países em desenvolvimento dizem que não são suficientes US$ 10 bilhões por ano (no curto prazo), que nos digam o que é suficiente. A longo prazo, estamos falando em talvez US$ 200 bilhões por ano para mitigação, e talvez US$ 100 bilhões por ano para adaptação.

- E quanto às promessas de redução de emissões de CO2 do Brasil e China?

Acho que todos concordam que, se receber financiamento internacional, tem que haver escrutínio internacional. A questão é: o que fazer com uma ação que o Brasil tomar sozinho? O Brasil diz: se estamos fazendo sozinhos e nos mesmos estamos pagando, não precisamos de ninguém para vir examinar.

- O senhor concorda?

Não é importante se eu concordo ou não. Mas existem os relatórios nacionais (no qual países relatam o que estão fazendo). Há acordo de que estes relatórios nacionais devem ser mais frequentes. Talvez esta seja a solução.

(O Globo, 11/12)
JCiência

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