segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

São Paulo aprova lei para boicotar carne produzida com desmatamento e trabalho escravo

Leonardo Sakamoto

Demorou, mas veio. O Diário Oficial da Cidade de São Paulo de hoje
traz publicada a lei 15.120/2010, de autoria do vereador Roberto
Trípoli (PV), estabelecendo procedimentos de controle ambiental e
social para a compra de carne bovina. O principal parágrafo da lei
tem a seguinte redação:

Art. 2º – Os editais de licitação de aquisição de produtos
alimentícios que incluam carne bovina “in natura”, realizados pelo
Município de São Paulo, deverão especificar, além das exigências de
habilitação elencadas na Lei nº 8.666 [a lei federal de licitações],
de 21 de junho de 1983, a apresentação de declaração do licitante, sob
as penas da lei, de que toda a carne a ser fornecida não será oriunda
de gado criado em áreas onde tenha ocorrido desmatamento irregular,
inclusive aquelas já embargadas pelos órgãos ambientais; nem de terras
indígenas invadidas; e não conterá, em sua cadeia produtiva, desde a
origem, a utilização de trabalho infantil e/ou escravo, nos termos do
modelo constante do Anexo I integrante desta lei.

Parágrafo único – Durante a execução do contrato deverá ser exigido,
no momento de cada entrega de carne bovina, a apresentação do
histórico da procedência do respectivo lote, desde a origem da cadeia
produtiva.

O prefeito Gilberto Kassab, que promulgou a lei, assinou durante a
campanha eleitoral de 2008 um termo de compromisso para desenvolver
políticas públicas que ajudassem a construir uma Amazônia sustentável,
parte integrante da iniciativa Conexões Sustentáveis: São Paulo –
Amazônia. A iniciativa busca mobilizar as cadeias de valor dos
setores da pecuária, da madeira e da soja através de pactos setoriais
para a preservação da floresta amazônica e seus povos. Os documentos
põem como obrigação dos signatários o financiamento, a distribuição e
a comercialização de produtos com certificação (ou que estejam em
processo de regularização) e provenientes de fornecedores que não
façam parte da “lista suja” do trabalho escravo ou de fontes com áreas
embargadas pelo Ibama.

O texto dos pactos também prevê a mobilização, por parte dos
signatários, para campanhas de esclarecimento a seus consumidores e
fornecedores. O cumprimento dos termos de compromisso em cada setor
está sendo monitorado por um comitê de acompanhamento.

Em 2008, estudos de cadeia produtiva da ONG Repórter Brasil e da Papel
Social realizados a pedido do Fórum Amazônia Sustentável e do
Movimento Nossa São Paulo para o Conexões Sustentáveis apontaram que a
Prefeitura de São Paulo estava inserida em cadeias produtivas da carne
bovina contaminadas com trabalho escravo e com desmatamento ilegal.

Há outros casos de leis aprovadas por parlamentos e sancionadas por
governos propondo ações de caráter semelhante. Por exemplo, no
Tocantins, uma legislação veda o estabelecimento de negócios da
administração pública direta ou indireta com empresas que tenham usado
trabalho escravo ou que tenham fornecedores que tenham usado. O
Maranhão veda o estabelecimento de negócios do Estado com quem esteja
na “lista suja” do trabalho escravo.

A lei paulistana, já em vigor, deve ser regulamentada no prazo de 60
dias a contar de hoje. Para que ela surta efeitos, é necessário que a
Prefeitura de São Paulo garanta transparência, tornando disponíveis as
declarações entregues. Dessa forma, os cidadãos e as organizações
sociais podem monitorar se a administração pública está financiando,
através de contratos de compra, produtores que se valem de práticas
que são socialmente e ambientalmente criminosas e ilegais.

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