segunda-feira, 8 de março de 2010

MUDANÇA CLIMÁTICA:
O perigoso metano escapa do Ártico


Stephen Leahy

A camada de gelo, que armazena milhares de milhões de toneladas de metano sob as frias águas do Mar Ártico, está deixando escapar esse gás-estufa para a atmosfera, segundo pesquisa publicada pela revista especializada Science.

Não se sabe se isto pode ser um dos primeiros indicadores de um círculo vicioso que acelere o aquecimento global.

Os pesquisadores estimam que, anualmente, sejam emitidas oito milhões de toneladas de metano pela Plataforma Ártica da Sibéria Oriental, o que equivale a todo o metano liberado pelos oceanos do mundo, que cobrem 71% do planeta. Os resultados das medições, realizadas agora na Sibéria, representam menos de 2% das emissões mundiais de metano derivadas de fontes com base na terra, como animais, arrozais ou vegetação em processo de putrefação.

“Isso é muito significativo. Antes se presumia que esta região tinha emissão zero”, afirmou à IPS Natalia Shakhova, pesquisadora da Universidade do Alasca em Fairbanks. As concentrações de metano medidas sobre os oceanos costumam ficar entre 0,6 e 0,7 partes por milhão (ppm), mas agora registram 1,85% no Mar Ártico em geral, e entre 2,6 e 8,2 ppm na Plataforma Ártica da Sibéria Oriental, uma área de aproximadamente dois milhões de quilômetros quadrados, disse Shakhova.

Ela e seu colega Igor Semiletov lideraram oito expedições internacionais a essa região, uma das mais remotas e desoladas do mundo. Seus resultados são os publicados na última edição da Science, na semana passada. Os níveis globais de metano aumentam anualmente desde 2007, após terem permanecido estáveis durante uma década, informou Ed Dlugokencky, do Laboratório de Pesquisas do Sistema Terrestre em Boulder, no Estado do Colorado, que funciona vinculado ao Escritório Nacional de Administração Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos.

Os cientistas comprovaram, em 2007, um aumento do metano no Ártico, mas isto não voltou a ocorrer em 2008, disse à IPS por e-mail Dlugokencky, especialista em metano atmosférico. Ele suspeita que as emissões submarinas da Sibéria não sejam novas, mas que ocorrem durante algum tempo. É necessário verificar por outros meios as estimativas de Shakhova que falam de oito milhões de toneladas, disse. Porém, reconheceu que este estudo representa a primeira medição direta já realizada na região, e que enfatiza a urgência de mais pesquisas.

Nos últimos anos, os pesquisadores experimentaram comoção ao verem algumas áreas do Mar Ártico “em ebulição”, quando os gases das profundezas saem, borbulhantes, para a superfície. Grandes setores do solo oceânico, que se estendem ao longo das áreas costeiras, foram, na realidade, “permafrost” – gelo permanente –, que passou a estado líquido há milhares de anos, depois do grande derretimento da última era do gelo. O permafrost é solo congelado e contém grandes concentrações de carbono e metano.

As águas extremamente frias do Ártico e sua cobertura gelada mantinham o permafrost submarino a temperaturas suficientemente baixas para que o derretimento fosse bastante lento. Até agora. Nos últimos anos, as temperaturas da superfície de boa parte da paisagem ártica e siberiana, particularmente no verão boreal, aumentaram entre seis e dez graus em relação aos registros normais. Isto levou a um enorme aumento no caudal de muitos rios que desembocam no Mar Ártico.

Shakhova e seus colegas acreditam que este aumento substancial de águas mais quentes na pouco profunda Plataforma da Sibéria Oriental acelerou o derretimento do permafrost submarino, rachando a cobertura gelada e permitindo que o metano vaze para a atmosfera. “O que nos preocupa é que o permafrost submarino já apresenta sinais de desestabilização”, disse a cientista em um comunicado. “Se a desestabilização aumentar, as emissões de metano poderão não ser em teragramas, pois serão significativamente maiores”, acrescentou. Um teragrama é igual a um bilhão de gramas ou um milhão de toneladas.

O metano é um gás-estufa cerca de 25 vezes mais potente do que o dióxido de carbono. É comum ser chamado de hidrato de metano quando está congelado no permafrost ou sob o mar. Ignora-se seu volume total. “A liberação na atmosfera de apenas 1% do metano, que se presumia armazenado em depósitos de hidrato pouco profundos, pode alterar em três ou quatro vezes a atual carga atmosférica de metano”, disse Shakhova em um comunicado. “As consequências climáticas disto são difíceis de prever”, acrescentou.

O estudo de Shakhova é apenas um de pelo menos uma dezena que mostram claramente que a região do Ártico não só está derretendo como também emitindo mais carbono e metano. O permafrost ocupa 13 milhões de quilômetros quadrados da terra no Alasca, Canadá, Sibéria e partes da Europa. Um novo estudo canadense documentou que o limite mais ao sul do permafrost diminuiu 130 quilômetros nos últimos 50 anos, na região de James Bay, em Québec.

Outro estudo, da Universidade da Flórida, diz que isso poderia causar emissões de um bilhão de toneladas de carbono por ano até meados do século. As emissões geradas pelos seres humanos ficam entre sete bilhões e oito bilhões de toneladas. Outra pesquisa canadense, divulgada no ano passado, mostra que a região está ficando mais escura e absorvendo mais calor no verão, devido a uma significativa mudança no crescimento de pastagens e líquens. Nos últimos 30 anos, estes se converteram em arbustos maiores devido às temperaturas mais altas.

Sem reduções importantes nas emissões contaminantes causadas pelos seres humanos, principalmente mediante a queima de combustíveis fósseis e o desmatamento, os dois a três metros superiores do permafrost de toda a região ártica podem descongelar até o final deste século, alerta o informe “”Reações do clima ártico: implicações globais”, apresentado em setembro pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF).

Se isso ocorrer, os volumes de carbono e metano liberados poderão ser muitas vezes maiores do que os atualmente existentes na atmosfera, o que fará aumentar em seis, oito ou mesmo dez graus as temperaturas médias mundial. As consequências são inimagináveis. “As mudanças que estamos vivendo não são totalmente inesperadas. Simplesmente estão ocorrendo muito antes”, disse Mark Serreze, pesquisador do Centro Nacional de Dados da Neve e do Gelo no Colorado e co-autor do informe do WWF. Se os hidratos de metano ou grandes áreas de permafrost começarem a derreter, “isso será uma péssima notícia para a humanidade”, disse Serreze à IPS em setembro passado. IPS/Envolverde
Foto:Maxtemperature

Um comentário:

  1. Onde posso saber mais sobre essa redução da area de "permafrost"?

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