Apesar dos atributos naturais e papel estratégico no cenário nacional,
plataforma das ONGs aos presidenciáveis aponta que as riquezas da Amazônia têm
gerado poucos benefícios sociais e econômicos para a grande maioria dos seus
mais de 24 milhões de habitantes.
Três
das principais ONGs que atuam na Amazônia decidiram se unir e apelar aos dois
presidenciáveis que disputam o segundo turno na eleições deste ano em nome do
desenvolvimento sustentável da Amazônia. A plataforma Amazônia e as Eleições
2014: Oportunidades e Desafios para o Desenvolvimento Sustentável
traz uma profunda análise da região e propõe recomendações que serão enviadas
aos candidatos à presidência da República. O documento foi elaborado pelo
Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), Instituto de Pesquisa
Ambiental da Amazônia (IPAM) e Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.
A
plataforma ressalta que a região é superlativa em recursos naturais e
importância ambiental. Abriga cerca de um terço das florestas tropicais, a maior
bacia hidrográfica do planeta e é rica em recursos minerais e em potencial
hidrelétrico. Suas florestas cumprem papel fundamental na conservação da
biodiversidade, no ciclo do carbono e regulação do clima. Também prestam um
serviço crucial para os brasileiros: a produção de cerca de 20 bilhões de
toneladas de vapor d’água por dia, que são transportadas em nuvens e geram
chuvas para o Centro-Sul do país.
“Apesar
desses atributos e do papel estratégico no cenário nacional, as riquezas da
Amazônia têm gerado poucos benefícios sociais e econômicos para a grande maioria
dos seus mais de 24 milhões de habitantes”, ressalta Paulo Barreto, pesquisador
do Imazon.
Mesmo
assim, a Amazônia passou ao largo dos debates no primeiro turno das eleições.
Para as entidades signatárias da plataforma, o desafio de promover o
desenvolvimento sustentável na região deve ser encarado a partir de agora como
uma questão de Estado, assumida pelo governo e pela sociedade brasileira. Ao
mesmo tempo, as ONGs afirmam que essa tarefa requer uma perspectiva e
prioridades regionais considerando a população local e a diversidade
socioeconômica da região.
A
ocupação da região, alertam as entidades, tem sido marcada pelo desmatamento e o
uso predatório dos recursos naturais. O desmatamento acumulado atingiu em 2013
cerca de 760 mil quilômetros quadrados. Apesar disso, o PIB da Amazônia Legal
tem se mantido em torno de 6% a 8% do total nacional nas últimas duas décadas, e
seu PIB per capita é cerca de metade da média brasileira. A região está atrás do
Brasil no cumprimento das metas do milênio e no Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH). O documento lembra o Índice de Progresso Social da Amazônia revelou que
98,5% dos 772 municípios da região têm uma pontuação de progresso social
inferior à média nacional, com saneamento precário, acesso limitado à internet,
educação básica de baixa qualidade, educação superior insuficiente e
insegurança. Alguns de seus municípios estão entre os mais violentos do Brasil,
destacam as entidades na justificativa dos pleitos aos candidatos.
"É
hora de constatar que os atuais investimentos na Amazônia não promovem
desenvolvimento, e que desmatamento é impeditivo do desenvolvimento. A partir
disso, é preciso desenhar e implementar uma política de desenvolvimento regional
baseada na diversidade do território" diz Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da
Terra - Amazônia Brasileira.
Propostas
– Para reverter o dramático quadro socioambiental da Amazônia, as ONGs
signatárias da plataforma pedem para que o novo governo reveja imediatamente a
política energética atualmente imposta para a região e que tem como base em um
ambicioso plano de expansão de geração de energia elétrica – que inclui a
construção de 30 hidrelétricas (UHE) na Amazônia até 2023. Além de investir em
eficiência energética, a plataforma reivindica priorizar fontes com menos
impactos socioambientais, incluindo eólica e solar (fotovoltaica) e
biomassa.
Enquanto
os investimentos públicos nas áreas de energia, óleo e gás, logística e
telecomunicações devem atingir cerca de R$ 130 bilhões até 2020 na Amazônia, o
licenciamento ambiental das respectivas obras não consegue induzir a mitigação
dos efeitos colaterais negativos.
Como
alternativa, as ONGs propõem que os investidores contribuam para um fundo cujos
recursos pagariam as análises de risco sem interferência de quem gera o impacto.
Querem ainda que o novo governo priorize investimentos em infraestrutura para o
desenvolvimento local, especialmente em saneamento básico, estradas vicinais e
geração de energia distribuída em comunidades rurais. É preciso combinar o
planejamento das obras com investimentos sociais, recomendam as
organizações.
O
fato de a Amazônia ter quase dois terços de sua população nas áreas urbanas
torna essencial priorizar a infraestrutura para a economia de serviços e
interromper o tradicional processo de “exportação” dos benefícios que tem
caracterizado os grandes empreendimentos de infraestrutura na região. Para isso,
é necessário capacitar as micro e pequenas empresas com prioridade para as
cidades médias no interior.
As
Unidades de Conservação da Amazônia também estão entre as preocupações da ONGs.
Em 2014, elas somavam 111 milhões de hectares na região. Elas foram, na opinião
dos ambientalistas, um dos pilares da política que reduziu o desmatamento da
região e que fez do Brasil o campeão mundial em reduções de emissões de gases do
efeito estufa entre 2005 e 2012 (-36,7%). As áreas protegidas também abrigam
biodiversidade e garantem serviços essenciais à humanidade (água, solos,
medicamentos, alimentos).
Para
proteger e estimular o uso efetivo das UCs, a plataforma recomenda um imediato
diagnóstico fundiário e regularização do passivo, com prioridade para as UCs
mais desmatadas e sob maior risco de desmatamento. A ideia é transformar as UCs
em vantagem para o desenvolvimento local. Uma forma de fazer isso seria pela
destinação de parte dos fundo de participação dos Estados e municípios (FPE e
FPM) para os governos locais que tiverem proporcionalmente mais UCs em seu
território.
Agronegócio
– Para que o setor se torne rentável e sustentável na Amazônia será necessário
investir em tecnologia. Por exemplo, um investimento de cerca de R$ 1 bilhão por
ano daria conta de suprir a demanda do aumento de consumo de carne até o ano
2022 melhorando a produtividade de um quarto da área de pasto mal utilizado.
Isso geraria 39 mil novos empregos. O valor adicional na produção agropecuária
seria de R$ 4,2 bilhões por ano, representando um aumento de 16% em relação a
2010.
As
ONGs lembram que irregularidade ambiental e fundiária e a baixa eficiência, no
entanto, aprisionam muitos produtores num dilema: sem regularização eles não
conseguem acesso a crédito. Porém, para custear a regularização, parte das
fazendas devem tornar-se mais produtivas – e, para isso, é preciso tomar crédito
para investir.
Para
estimular o uso mais eficiente e sustentável das terras na região, as ONGs
sugerem acelerar a regularização das posses, mas sem subsídios, e cobrar
efetivamente o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural e alocar as terras
públicas devolutas.
O
apoio à agricultura familiar na Amazônia também deve de ser revisto. Os 2.261
assentamentos federais somam mais de 30 milhões de hectares, com aproximadamente
400 mil famílias assentadas. Esse território ainda detém 15,8 milhões de
hectares em floresta, dos quais 13,3 milhões (84%) concentram-se em apenas 600
assentamentos. No entanto, a grande maioria desses assentamentos tem sido
implantada sem investimentos adequados em infraestrutura, serviços sociais
básicos e assistência técnica. O resultado tem sido a combinação de degradação
ambiental, conflitos sociais, inviabilidade econômica das atividades agrícolas
ou extrativistas e, consequente, o abandono ou venda ilegal dos lotes.
Para
estimular a conservação e a restauração florestal, a plataforma sugere que o
governo federal institua pagamentos por serviços ambientais para os agricultores
familiares, conforme já autorizado pelo novo Código Florestal e de outras fontes
de financiamento. O pagamento deveria ser condicionado ao monitoramento da
cobertura florestal por meio de imagens de satélite. Os indicadores de progresso
social poderiam ser usados para identificar as áreas prioritárias para
recebimento desses pagamentos.
“Hoje
existe a oportunidade de desenvolver uma economia florestal integrada, com
prioridade para investimentos industriais baseados na integração
lavoura-pecuária-floresta”, afirma Paulo Moutinho, do IPAM. Segundo ele, essa
abordagem integraria as cadeias para atingir maior produtividade da pecuária,
diversificar a produção e reduzir riscos, ao mesmo tempo em que viabilizaria o
uso e a recuperação de quase meio milhão de quilômetros quadrados de terrenos
alterados e abandonados. Para isso é preciso combater a exploração ilegal de
madeira, destinar terras públicas para o manejo florestal, estimular o
reflorestamento e a modernização da indústria.
O
texto aos candidatos alerta ainda para a necessidade de uma política eficaz e
com escala que estimule a proteção de florestas nativas e que restaure áreas
degradadas. Entre as sugestões para direcionar recursos para a conservação dos
serviços ambientais estão, por exemplo, o condicionamento dos subsídios já
existentes ao desempenho ambiental e a criação da Cide-Carbono, a qual poderia
estar atrelada à emissão pelo uso de combustíveis fósseis, arrecadando recursos
para setores que promovam a recuperação de passivos ambientais. Os recursos
gerados, por exemplo, poderiam ser utilizados para subvencionar atividades de
recuperação florestal, que fixam carbono.
Fonte\; IPAM Amazônia
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