quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

O Código Florestal e o pequeno produtor


O empenho dos ruralistas em colocar em regime de urgência a votação em plenário do Código Florestal indica de que no início da próxima legislatura, em fevereiro, voltará a pressão pela votação do relatório Aldo Rebelo.

Na linha de resistência, os esforços das organizações da sociedade civil contrárias às alterações no Código não têm sido suficientes para "convencer" parlamentares identificados com os interesses do agronegócio a não votarem favoravelmente à proposta, caso ela vá a plenário. Adicionalmente, no trabalho quase cotidiano de monitorar o Congresso e reagir às investidas dos ruralistas, tem havido ensaios no sentido de construir adaptações ao Código que não impliquem em retrocessos, mas este novo rumo para o debate ainda está por vir.

As entidades representativas dos pequenos produtores e assentados de reforma agrária têm demonstrado capacidades diferenciadas de mobilizar suas bases para uma resistência mais explícita às mudanças. Assim como são diferenciadas as reações de suas bases à sedução de se desobrigarem de manter a Reserva Legal. Isto, a despeito da clareza geral de que a medida de desobrigação da Reserva Legal nas propriedades até quatro módulos fiscais, que é de fato a única alteração endereçada especificamente ao pequeno produtor, está a serviço de uma estratégia dos ruralistas de ampliação da base social favorável a todo o pacote de alterações pretendidas.

Esta incerta resistência das entidades parece um reflexo da própria dificuldade de convencer suas bases de que a mudança, além de oportunista, não é uma saída para o pequeno produtor. Em grande medida isto ocorre porque, de fato, é difícil resistir à tentação de apoiarem uma proposta que promete isentá-los do ônus financeiro por ações de desmatamento e da culpa por não cumprirem "as leis". Ou seja, a irregularidade ambiental da pequena produção é sim um problema que requer uma solução.

Pensando por essa ótica, a construção de uma resistência mais firme a essa proposta de alteração do Código Florestal passa, centralmente, pela capacidade de construir uma alternativa adequada à pequena produção.

Para o pequeno produtor, como já assinala a Via Campesina em sua nota, o caminho da sustentabilidade passa por: "assistência técnica capacitada para o manejo florestal comunitário; crédito e fomento para desenvolvimento produtivo diversificado; recuperação das áreas degradadas com sistemas agroflorestais; planos de manejo madeireiro e não-madeireiro simplificados; canais de comercialização institucional que viabilizem a produção oriunda das florestas".

Além destes passos, outro que nos parece fundamental hoje, ainda mais diante da crise climática global, é valorizar mais efetivamente a função ambiental da pequena produção. A instituição de uma política de pagamento por serviços ambientais que remunere devidamente e de forma desburocratizada os pequenos produtores pela manutenção das suas Reservas Legais e Áreas de Preservação Permanente é um tema crucial neste debate. É um caminho que já vem sendo trilhado por inúmeras iniciativas, em Minas Gerais, na Bahia, no Espírito Santo; que precisam ganhar força e escala.

A proposta de novo Código Florestal está na contramão desta saída, tanto quanto também estão as duas propostas que tramitam na Câmara sobre Serviços Ambientais (PL nº 792/07) e REDD+ (PL nº 5.586/09), recentemente aprovadas pela Comissão de Agricultura. Estão construídas para compensar os produtores, em especial os grandes, pelo seu esforço de manutenção de áreas de preservação que excedem aquelas legalmente previstas. Por sinal, este é outro elemento que explica o anseio dos ruralistas em reduzir as áreas obrigatórias de preservação.

Fará grande diferença a retomada de esforços conjuntos entre organizações socioambientalistas e entidades representativas de agricultores familiares, camponeses e trabalhadores/as rurais objetivando a construção de alternativas que equacionem melhor a função social e ambiental da pequena produção.

É preciso que o diálogo e a articulação entre esses setores sejam rapidamente fortalecidos e que as falsas contradições sejam superadas em favor de propostas que contemplem os legítimos interesses dos pequenos produtores e a sustentabilidade ambiental.

* Instituto de Estudos Socioeconômicos
(Envolverde/Adital)

A Amazônia atingiu apenas um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Por Redação Amazônia.org

A Amazônia atingiu apenas um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela ONU no ano 2000, de acordo com estudo realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia – Imazon.

Os Objetivos do Milênio incluem metas e indicadores para medir e orientar melhorias nas condições socioeconômicas (pobreza, educação, saúde, desigualdade entre os gêneros, mortalidade infantil e materna) e ambientais em regiões pobres e em desenvolvimento do mundo.

A publicação “A Amazônia e os Objetivos do Milênio 2010” avalia a evolução desses objetivos e metas no contexto da Amazônia através da análise de 25 indicadores, em relação às metas propostas para 2015. Essa publicação atualiza o estudo do Imazon apresentado em 2007.

Na Amazônia houve progressos no que se refere à maioria dos indicadores analisados se compararmos a situação em 2009 à de 1990. Entretanto, em geral, essa melhoria é insatisfatória e a região está abaixo da média nacional. A situação é crítica no caso da pobreza, da incidência de malária, Aids, mortalidade materna e do saneamento básico. Os avanços foram tímidos na busca da igualdade entre os gêneros, sendo que as mulheres têm pouca participação na política e são desfavorecidas no mercado de trabalho. Além disso, a região tem altos índices de violência.

Por outro lado, houve queda na mortalidade infantil (embora haja fortes indícios de sub-registros nas estatísticas oficiais) e o acesso à educação aumentou (contudo, melhorar a qualidade ainda é um desafio).

A região avançou também na criação de Áreas Protegidas (Terras Indígenas e Unidades de Conservação), que ocupavam pouco mais de 8% do território da Amazônia em 1990, saltando para cerca de 44% em 2010. Além disso, o desmatamento caiu expressivamente nos últimos anos, registrando em 2010 a menor taxa da história (6.451 km2).

Entraves sociais

Para Danielle Celentano, uma das autoras da publicação, os avanços na área ambiental precisam ser acompanhados por melhores resultados na área social. “A criação de Áreas Protegidas e a queda do desmatamento são ótimas noticias, mas agora é o momento de olharmos mais para as pessoas que vivem na Amazônia”, pondera.

Para Daniel Santos, pesquisador do Imazon e co-autor do estudo, este trabalho tem o mérito de apontar os entraves sociais críticos da Amazônia. “Solucioná-los significa alcançar uma nova era de desenvolvimento para a população dessa região. Trabalhar na melhora dos indicadores em situação crítica seria uma “receita de sucesso” para a Amazônia e cada um dos seus nove Estados”, comenta.

Veja dados incluídos no estudo:

Pobreza Extrema - Entre 1990 e 2009 a pobreza extrema (população com renda inferior a um quarto do salário mínimo) diminuiu de 23% para 17% na Amazônia, mas ainda falta reduzir 7 pontos percentuais para atingir a meta brasileira para 2015 (10%).

Ensino Básico Universal - A população com mais 15 anos de idade analfabeta diminuiu de 20%, em 1990, para 11% em 2009 na Amazônia, no entanto ainda persiste um alto analfabetismo funcional na região (23% da população com mais 15 anos de idade).

Mortalidade infantil - A mortalidade de crianças até 1 ano caiu 52% na Amazônia entre 1991 e 2009, ou seja, passou de 51 para 25 óbitos para cada 1.000 nascidos vivos. Mantida a taxa atual de queda, essa meta poderá ser atingida na Amazônia até 2015. Porém, há indícios de que há um forte sub-registro de mortalidade infantil na região .

HIV/Aids, malária e outras doenças - A taxa de incidência de Aids aumentou exponencialmente entre 1990 e 2008 na Amazônia, enquanto a taxa brasileira apresentou sinais de redução. Em 2009 foram registrados mais de 306 mil casos novos de malária na região, o que representa uma queda em relação aos anos anteriores. A taxa, porém, continua elevada. Outras doenças, como a hanseníase (a Amazônia é líder mundial em incidência) e leishmaniose (taxa quase sete vezes maior que a brasileira) estão em situação crítica.

Sustentabilidade Ambiental - Em 2009, a área florestal desmatada na Amazônia foi de 7.464 quilômetros quadrados, o que representou uma queda de 42% em relação ao ano anterior. Em 2010, o desmatamento caiu novamente, apresentando seu número mais baixo nos últimos 20 anos. Além disso, 44% da região está protegida por Unidades de Conservação e Terras Indígenas. A má noticia é que o saneamento básico continua precário na Amazônia: por exemplo, pequena parte (10%) da população é servida por rede de coleta de esgoto e a maioria (58%) do lixo produzido é depositada em lixões a céu aberto.

Acesse o estudo na íntegra: "A Amazônia e os Objetivos do Milênio 2010" (http://www.imazon.org.br/novo2008/publicacoes_ler.php?idpub=3772)



(Envolverde/Amazônia.org.br)A Amazônia atingiu apenas um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela ONU no ano 2000, de acordo com estudo realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia – Imazon.

Os Objetivos do Milênio incluem metas e indicadores para medir e orientar melhorias nas condições socioeconômicas (pobreza, educação, saúde, desigualdade entre os gêneros, mortalidade infantil e materna) e ambientais em regiões pobres e em desenvolvimento do mundo.

A publicação “A Amazônia e os Objetivos do Milênio 2010” avalia a evolução desses objetivos e metas no contexto da Amazônia através da análise de 25 indicadores, em relação às metas propostas para 2015. Essa publicação atualiza o estudo do Imazon apresentado em 2007.

Na Amazônia houve progressos no que se refere à maioria dos indicadores analisados se compararmos a situação em 2009 à de 1990. Entretanto, em geral, essa melhoria é insatisfatória e a região está abaixo da média nacional. A situação é crítica no caso da pobreza, da incidência de malária, Aids, mortalidade materna e do saneamento básico. Os avanços foram tímidos na busca da igualdade entre os gêneros, sendo que as mulheres têm pouca participação na política e são desfavorecidas no mercado de trabalho. Além disso, a região tem altos índices de violência.

Por outro lado, houve queda na mortalidade infantil (embora haja fortes indícios de sub-registros nas estatísticas oficiais) e o acesso à educação aumentou (contudo, melhorar a qualidade ainda é um desafio).

A região avançou também na criação de Áreas Protegidas (Terras Indígenas e Unidades de Conservação), que ocupavam pouco mais de 8% do território da Amazônia em 1990, saltando para cerca de 44% em 2010. Além disso, o desmatamento caiu expressivamente nos últimos anos, registrando em 2010 a menor taxa da história (6.451 km2).

Entraves sociais

Para Danielle Celentano, uma das autoras da publicação, os avanços na área ambiental precisam ser acompanhados por melhores resultados na área social. “A criação de Áreas Protegidas e a queda do desmatamento são ótimas noticias, mas agora é o momento de olharmos mais para as pessoas que vivem na Amazônia”, pondera.

Para Daniel Santos, pesquisador do Imazon e co-autor do estudo, este trabalho tem o mérito de apontar os entraves sociais críticos da Amazônia. “Solucioná-los significa alcançar uma nova era de desenvolvimento para a população dessa região. Trabalhar na melhora dos indicadores em situação crítica seria uma “receita de sucesso” para a Amazônia e cada um dos seus nove Estados”, comenta.

Veja dados incluídos no estudo:

Pobreza Extrema - Entre 1990 e 2009 a pobreza extrema (população com renda inferior a um quarto do salário mínimo) diminuiu de 23% para 17% na Amazônia, mas ainda falta reduzir 7 pontos percentuais para atingir a meta brasileira para 2015 (10%).

Ensino Básico Universal - A população com mais 15 anos de idade analfabeta diminuiu de 20%, em 1990, para 11% em 2009 na Amazônia, no entanto ainda persiste um alto analfabetismo funcional na região (23% da população com mais 15 anos de idade).

Mortalidade infantil - A mortalidade de crianças até 1 ano caiu 52% na Amazônia entre 1991 e 2009, ou seja, passou de 51 para 25 óbitos para cada 1.000 nascidos vivos. Mantida a taxa atual de queda, essa meta poderá ser atingida na Amazônia até 2015. Porém, há indícios de que há um forte sub-registro de mortalidade infantil na região .

HIV/Aids, malária e outras doenças - A taxa de incidência de Aids aumentou exponencialmente entre 1990 e 2008 na Amazônia, enquanto a taxa brasileira apresentou sinais de redução. Em 2009 foram registrados mais de 306 mil casos novos de malária na região, o que representa uma queda em relação aos anos anteriores. A taxa, porém, continua elevada. Outras doenças, como a hanseníase (a Amazônia é líder mundial em incidência) e leishmaniose (taxa quase sete vezes maior que a brasileira) estão em situação crítica.

Sustentabilidade Ambiental - Em 2009, a área florestal desmatada na Amazônia foi de 7.464 quilômetros quadrados, o que representou uma queda de 42% em relação ao ano anterior. Em 2010, o desmatamento caiu novamente, apresentando seu número mais baixo nos últimos 20 anos. Além disso, 44% da região está protegida por Unidades de Conservação e Terras Indígenas. A má noticia é que o saneamento básico continua precário na Amazônia: por exemplo, pequena parte (10%) da população é servida por rede de coleta de esgoto e a maioria (58%) do lixo produzido é depositada em lixões a céu aberto.

Acesse o estudo na íntegra: "A Amazônia e os Objetivos do Milênio 2010" (http://www.imazon.org.br/novo2008/publicacoes_ler.php?idpub=3772)

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Zoneamento de MT seguiu critérios políticos, diz diretor


João Negrão, de Brasília

A elaboração do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico de Mato Grosso foi feita sob critérios políticos e não técnicos. Isso fere os critérios estabelecidos pelo decreto que regulamenta os zoneamentos, com base na Política Nacional do Meio Ambiente. Desta forma, o plano de Mato Grosso se contradiz com o Marcrozoneamento Ecológico da Amazônia Legal.

O alerta foi feito pelo engenheiro agrônomo Roberto Vizentin, diretor de Zoneamento Territorial do Ministério do Meio Ambiente, encarregado de organizar os zoneamentos no âmbito federal e acompanhar as iniciativas estaduais. Vizentin participa do Seminário Visão Estratégica da Amazônia Legal, que teve início em Brasília nesta quarta (13) e prossegue até esta quinta.

Um dos temas do seminário é justamente o Macrozoneamento Ecológico da Amazônia Legal. Dentro dessa abordagem está inserido Mato Grosso, que é um dos nove Estados que fazem parte da Amazônia Legal brasileira. O seminário discute também, entre outros temas, as “Cidades Amazônicas, sua complexidade e diversidade”. Cuiabá também é tema desse painel. O Macrozoneamento Ecológico-Econômico da Amazônia Legal (MacroZEE) aponta uma estratégia de ordenamento e ocupação da Amazônia que identifica o potencial de crescimento econômico em áreas como turismo, produção de produtos da sociobiodiversidade, infraestrutura, piscicultura e polos tecnológicos.

Ao analisar o atual estágio em que se encontra o Zoneamento mato-grossense, que atualmente tem sua tramitação paralisada na Assembleia do Estado, Vizentin concluiu que o plano até agora encaminhado pelos deputados confronta as diretrizes técnicas definidas para elaboração dos zoneamentos. Ele recorda que ocorreram audiências públicas em todos os pólos de Mato Grosso para discutir o plano apresentado pelo governo do Estado para apreciação da AL. “O problema é que após as audiências todas as colaborações técnicas, inseridas no substitutivo do relator, foram desprezas pelo presidente da Comissão, que apresentou outro substitutivo, prevalecendo os critérios políticos", reclama Vizentin, em entrevista ao RDNews.



O relator da comissão que encaminhou os debates sobre o zoneamento de Mato Grosso na AL foi o então deputado Alexandre Cesar (PT) . O presidente é o deputado Dilceu Dal Bosco (DEM), candidato derrotado a vice-governador na chapa de Wilson Santos (PSDB).

Além das contradições com as diretrizes do Plano Nacional de Meio Ambiente, aponta Roberto Vizentin, há dúvidas em relação à redução do percentual de reserva legal para fins de recomposição florestal. Na versão atual da AL, o percentual é de 50% previsto no Zoneamento Socioeconômico e Ecológico. “O zoneamento pode indicar esse benefício, mas a dúvida é: com quais critérios foram estabelecidos os 50%”, pontua Vizentin.

O Seminário Visão Estratégica da Amazônia! é promovido pela secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, em parceria com o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Reúne especialistas com estudos recentes, entidades da sociedade civil e tomadores de decisão para discutir a inserção da Amazônia no contexto do desenvolvimento do Brasil. A região da Amazônia cobre quase metade do território nacional, abrange nove Estados e tem uma população de cerca de 25 milhões de pessoas.

Os debates vão acontecer até o final da tarde desta quinta (14). Ao todo são cinco painéis temáticos, em que estão sendo discutidas questões chaves para promover o desenvolvimento da Amazônia, com foco na sustentabilidade social, ambiental e econômica. Questões como o aproveitamento hidrelétrico frente ao uso múltiplo dos recursos hídricos e os limites e oportunidades das estratégias de aproximação entre mineração e conservação da biodiversidade também estão na pauta.
Blog do Romilson

Entra no ar nova rede social de ativistas sociais


Internautas “de bem”, na intenção de “mudar o mundo”, começaram a se cadastrar em uma nova rede social que vai agregar quem busca soluções para os mais diversos problemas ao redor do planeta, o Jumo . A rede foi criada por um dos fundadores do Facebook.Em entrevista ao jornal americano Washington Post, Chris Hughes, de 26 anos, disse que quando o assunto é educação, saúde, economia ou outro tema que abranja a população, “o problema básico é que há milhões de grupos trabalhando nesses assuntos, mas não há nenhum sistema que os conecte”.

Questões filantrópicas

Hughes pensou na rede social a partir das experiências que teve como cofundador do Facebook e como diretor de redes sociais na campanha do presidente norte-americano, Barack Obama. Após ver o quão poderosa pode ser esse tipo de ferramenta, ele decidiu que era hora de usar as redes para questões filantrópicas; então reuniu uma equipe com especialistas que conseguissem criar um algoritmo para monitorar o interesses dos internautas em causas sociais por meio do Twitter, YouTube ou nos e-mails.

O Jumo (”juntos em concerto”, em yoruba, idioma da África Ocidental) tinha mais de 66 mil registros de usuários no começo deste mês, antes mesmo de estar funcionamento efetivamente. Para usá-lo o internauta precisa ter conta no Facebook, pois será necessário passar pelo conector do site de Mark Zuckerberg para acessar a rede. Lá há áreas de debates e os usuários poderão opinar sobre as ações humanitárias que estiverem acontecendo.

(Portal ODM/Mercado Ético)

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Entrevista com Assenge, fundador do Wikileaks

By Caue Seigne Ameni– 8 de dezembro de 2010
A entrevista realizada em julho de 2010, em Oxford, na Inglaterra.



Para ler a legenda em português basta clicar em “View subtitles” e escolher o idioma de sua preferência.

Outras Palavras

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Uma revolução começou — e será digitalizada


Por Heether Brooke*, do The Guardian

A diplomacia sempre incluiu jantares com as elites dominantes, acertos de bastidores e encontros clandestinos. Agora, na era digital, os relatos de todas estas festas e diálogos aristocráticos pode ser reunido numa enorme base de dados. Uma vez recolhidos em formato digital, é muito fácil compartilhá-los.

Na verdade, é para isso que a base de dados Siprnet, de onde os segredos diplomáticos norte- americanos são vazados, foi criada. A comissão governamental criada nos EUA para avaliar a segurança nacional após o 11 de Setembro fez uma descoberta notável: não era o compartilhamento de informações que ameaçava os EUA, mas o não-compartilhamento. A falta de cooperação entre agências governamentais e a retenção de informações por burocratas desperdiçaram muitas oportunidade para bloquear os ataques contra as Torres Gêmeas. Em resposta, a comissão ordenou uma restruturação dos serviços do governo e da inteligência, para que se adaptassem à própria web. A nova prática era de colaboração e compartilhamento de informações. Mas, ao contrário de milhões de membros do governo e empresas terceirizadas, o público não tinha acesso à Siprnet.

Porém, os dados têm o hábito de se espalhar. Eles escorregam entre a segurança militar e também podem vazar pelo Wikileaks, o meio pelo qual eu obtive as informações. Eles violaram até os prazos de fechamento do Guardian e de outros jornais envolvidos na divulgação da história, quando um cópia clandestina do semanário alemão Der Spiegel acidentalmente chegou às bancas em Basle, na Suíça, domingo passado. Alguém a comprou, entendeu o que ela continha e começou a escanear as páginas, traduzindo-as do alemão para o inglês e postando no Twitter. Parece que os dados digitalizados não respeitam autoridade alguma, esteja ela no Pentágono, no Wikilieaks ou num editor de jornais.

Cada um de nós já viveu, pessoalmente, as enormes mudanças que vêm com a digitalização. Fatos ou informação que considerávamos efêmeros e privados agora são permanetes, públicos e agregáveis. Se o volume dos atuais vazamentos parece grande, pense nos 500 milhões de usuários do Facebook, ou nos milhões de registros mantidos pelo Google. Os governos mantêm nossos dados pessoais em enormes bases. Era caro obter e distribuir informação. Agora, é caro retê-la.

Mas quando os devassa de dados atinge o público, os governantes parecem não se importar muito. Nossa privacidade é disponível. Não surpreende que a reação aos novos vazamentos seja, agora, diferente. O que transformou, num sentido revolucionário, a dinâmica do poder não é a escala das revelações – mas o fato de que indivíduos podem tornar pública uma cópia de documentos do Estado. Em papel, estes vazamentos equivalem, segundo estimativas do Guardian, a 213.969 paginas A4, que teriam, empilhadas, a altura de 43 quilômetros. Algo impossível de vazar com segurança, na era do papel.

Para alguns, a novidade significa uma crise. Para outros, uma oportunidade. A tecnologia está rompendo as barreiras tradicionais de classe, poder, riqueza e geografia – e substituindo-as por um ethos de colaboração e transparência.

Um ex-embaixador dos Estados Unidos na Rússia, James Collins, disse à CNN que a revelação dos registros pelo Wikileaks “impedirá que as coisas seja feitas de forma normal e civilizada”. Muito frequentemente, “normal” e “civilizado” significa, na linguagem diplomática, fazer vistas grossas para injustiças sociais flagrantes, corrupção e abuso de poder. Depois de ler centenas de documentos, constato que muito dos “danos” que eles provocam é revelação embaraçosa e constrangedora de verdades inconvenientes. Em nome da segurança de uma base militar num dado país, nossos líderes aceitam um ditador brutal que oprime seu povo. Isso pode ser conveniente a curto prazo para os políticos, mas as consequências a longo prazo para os cidadãos do planeta podem ser catastróficas.

Os vazamentos não são o problema, apenas o sintoma. Revelam a desconexão entre aquilo que as pessoas desejam e precisam e o que realmente fazem. Quanto maior o segredo, mais prováveis os vazamentos. O caminho para superá-los é assegurar um mecanismos robustos para acesso público a informação relevante.

Graças à internet, esperamos um nível muito maior de conhecimento e participação, em muitos aspectos de nossas vidas. Mas os políticos resistem resolutamente aos novos tempos. Vêem-se como tutores de um público infantil – que não merece nem a verdade, nem o poder real que o conhecimento oferece.

Muito da revolta governamental sobre os vazamentos não tem a ver com o conteúdo do que é revelado, mas com a audácia de quem rompe o que eram fortalezas invioláveis da autoridade. No passado, confiávamos nas autoridades. Se um governante nos dissesse que algo poderia prejudicar a segurança nacional, tomávamos a afirmação como verdade. Agora,os dados crus por trás desta crença estão se tornando públicos. O que percebemos de vazamentos sobre as despesas de parlamentares, ou a cumplicidade de governos com a tortura, é que quando os políticos falam sobre uma ameaça à “segurança nacional”, referem-se frequentemente à defesa de sua própria posição ameaçada.

Estamos num momento crucial, em que alguns visionários, na vanguarda de uma era digital, enfrentam quem tenta, desesperadamente, controlar o que sabemos. O Wikileaks é o front de guerrilha, num movimento global por maior transparência e participação. Projetos como o Ushahidi usam redes sociais para criar mapas onde os cidadãos podem relatar violências e desafiar a versão oficial dos fatos. Há ativistas empenhados em liberar dados oficiais, para que as pessoas possam ver, por exemplo, os orçamentos públicos em detalhe.

Por ironia, o Departamento de Estado dos EUA foi um dos grandes incentivadores da inovação técnica, como meio para levar a democracia a países como o Irã e a China. O presidente Obama exortou regimes repressores a deixar de censurar a internet. No entanto, uma lei que tramita no Congresso permite ao Procurador-Geral em Washington criar uma “lista suja” de websites. É possível acreditar numa democracia forte apenas para assuntos externos?

Os governantes costumavam controlar os cidadãos por meio do fluxo restrito de informações. Agora, está se tornando impossível vigiar o que a sociedade lê, vê e ouve. A tecnologia permite desafiar coletivamente a autoridade. Os poderosos vigiaram por muito tempo as sociedades, para controlá-las. Agora, os cidadãos estão lançando um olhar coletivo sobre o poder.

É uma revolução, e todas as revoluções geram medos e incertezas. Caminhamos para um Novo Iluminismo da Informação? Ou a revanche daqueles quer querem manter controle a qualquer custo nos levará a um novo totalitarismo? O que ocorrer nos próximos cinco anos definirá o futuro da democracia no próximo século. Por isso, seria ótimo que os nossos líderes respondessem aos desafios de hoje com um olhar sobre o futuro.


*Heether Brooke é jornalista, escritora e ativista pelo Direito à Informação. Nascida nos Estados Unidos, vive em Londres e colabora com o The Guardian.

A César o que é de César


Líder da bancada do agronegócio no Congresso e fiel defensora das propostas de mudanças no Código Florestal brasileiro, a senadora Kátia Abreu (DEM-TO) recebeu das mãos de uma ativista do movimento indígena da Amazônia, junto com o Greenpeace, o prêmio Motosserra de Ouro, símbolo de sua luta incansável pelo esfacelamento da lei que protege as florestas do país.

A ativista tentou presentear Kátia Abreu com uma réplica dourada do instrumento usado para desmatar florestas no lobby do hotel em que está hospedada em Cancún, onde participa da 16ª Conferência de Clima da ONU (COP16). A senadora desprezou o agrado, visivelmente irritada, e deixou para a ativista apenas os comentários irônicos de seus assessores. A condecoração serviu para lembrar aos ruralistas defensores do relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), que prevê alterações na lei, que essa proposta representa uma grave ameaça ao ambiente.

O projeto ruralista anistia desmatadores e reduz o tamanho da área que o proprietário de terra e o Estado estão obrigados a conservar para o bem público. Fazendas, dependendo do tamanho, ou serão dispensadas de ter árvores ou poderão ter menos do que devem atualmente. O projeto também diminui as faixas de floresta em beiras de lagos e rios e em encostas, que além de servir como corredores de biodiversidade evitam enchentes, deslizamentos e protegem a qualidade da água.

Caso a turma da motosserra consiga mudar a lei nos termos em que pretendem, tornarão inviável para o Brasil honrar as metas de queda de desmatamento assumidas em Copenhague, na COP15, que preveem a redução até 2020 de 36% a 39% de nossas emissões de gases-estufa. A proposta prejudica também as negociações sobre Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD), que institui o pagamento para a conservação de floresta para quem vive nela. “Se o Brasil legalizar mais desmatamentos, o custo da conservação aumentará muito e pode tornar a aplicação do REDD no Brasil inviável”, explica André Muggiati, representante da Campanha Amazônia do Greenpeace na COP16.

A bancada da motosserra continua lutando nos bastidores para que um novo e enfraquecido código seja votado a qualquer preço, ainda este ano. Querem que algo tão importante para o Brasil seja decidido já, por uma Câmara em fim de mandato, e sem a devida discussão com a sociedade. “As alterações no Código Florestal representam um retrocesso em uma das legislações florestais mais avançadas do mundo”, diz Muggiati.

Este protesto teve o apoio do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB).

Feliz Natal?

Em um apelo ao espírito natalino, um grupo de ONGs, entre elas o Greenpeace, levou Papai Noel até Cancún para ajudar a impedir que a bancada do agronegócio empurre suas propostas de mudança no Código Florestal goela abaixo dos brasileiros.

O bom velhinho ficou nesta manhã na porta do Cancun Messe, um dos prédios onde acontece a COP16, entregando mudas de árvores aos que passam, acompanhado de ativistas com dois cartazes, em português e inglês, onde se lia “Mudar o Código Florestal = Um Natal sem árvores”. Se as alterações no código forem aprovadas no Congresso, o Brasil pode se preparar para, no futuro, celebrar Natais com bem menos áreas de florestas.

O Papai Noel em Cancún teve como parceiros o Observatório do Clima, o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), além do Greenpeace.

(Greenpeace)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Proteção ambiental incomoda muita gente


Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira na abertura da reunião do Conama (foto: Blog Marcio Mendes)

Lisiane Becker
Mais um duro golpe na conservação do patrimônio natural brasileiro, no ano da biodiversidade! O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a mais alta instância da política ambiental do país, que deveria tratar de proteger os recursos naturais, decide revogar uma resolução aplicada desde 1990.

O retrocesso foi iniciado no ano passado, quando a Câmara Técnica de Unidades de Conservação (UC) e Demais Áreas Protegidas – desativada há quase dois anos – recebeu proposta de resolução para disciplinar o art. 36 da Lei 9985/2000 - que trata de empreendimentos que exijam EIA/RIMA, isto é, que causem grandes impactos ambientais. Tal proposta não deveria constituir em nova resolução, como muito foi afirmado até a sua aprovação em plenário no final de novembro.

Sua alegada intenção era reduzir a insegurança jurídica para empreendedores, reduzir processos de licenciamento (como permissão de entrada de caminhão para descarregar material, por exemplo) e, a parte mais louvável, regrar e, portanto, agilizar os trâmites entre os órgãos competentes. Para espanto (e só meu...), a Resolução 13/90 (que dispõe sobre áreas circundantes em áreas protegidas) – entre outras - constava no último artigo para ser revogada. Ora, a MIRASERRA, entidade a quem represento, mantém há anos liminares contra a União e outros entes, em duas ações judiciais com ampla fundamentação incluindo esta resolução. Destaca-se que, inclusive, criou referencial para a área circundante das Reservas Particulares de Patrimônio Natural (RPPNS).

O “lobby” para a revogação da Res.CONAMA 13/90 era maior que a fundamentação para tal. Isto ficou cristalino quando o Ministério do Meio Ambiente (MMA) apresentou uma proposta de zonas de amortecimento “transitórias” que variavam de acordo com as dimensões da unidade de conservação (UC), para aquelas ainda sem Plano de Manejo. Ficou evidente, até mesmo para a Câmara Técnica de Assuntos Jurídicos, que seria criada uma lacuna jurídica. Atividades de pequeno e médio porte não teriam previsão legal para que as UCs pudessem, ao menos, se precaver contra distúrbios menores no fluxo gênico ou de efeito de borda pontuais – para ficar nestes dois exemplos. Então, foi criado um capítulo para que empreendimentos que não exigissem EIA/RIMA também fossem disciplinados quanto ao seu trâmite processual.

O texto final foi à plenária, onde dezenove entidades pediram vista do processo, sendo criado um Grupo Assessor (GA) para sistematização dos pareceres apresentados.

No GA, mais uma vez, foi difícil manter qualquer vestígio da intenção da Res. 13/90, já que era alegado em uníssono, que área circundante é o mesmo que zona de amortecimento. Portanto, dizia-se, a respectiva resolução já teria sido revogada na prática quando da publicação da Lei do SNUC, apesar do Ministério Público a considerar “viva”. Houve todo o tipo de desculpa, principalmente a da insegurança jurídica e até mesmo, que o endereço do gestor da UC poderia não ser encontrado para dar autorização, levando o processo “ad eternum” como constantemente ouvi a expressão. Todas estas pretensas explicações carecem de fundamento, frente ao regramento que ora se delineava.

A proposta resultante do GA, para apreciação do Conama, chamava a atenção de que algo estaria muito errado: o artigo 5º oferecia 3 opções, sendo que o valor para área de entorno de UC (um “referencial”, como disse o MMA) estava em aberto. Ora, na resolução 13/90 era de 10Km e se queixavam da arbitrariedade deste número. Agora, decididamente, o número foi retirado de alguma cartola mágica, já que dos 6 Km propostos em plenário, ficaram só 3 Km!! E, com validade no rótulo: se em 5 anos não tiver plano de manejo com zona de amortecimento definida, não terá proteção alguma!!!

E as RPPNs? Embora fosse clara a simpatia de vários setores pelas RPPNs frente à hostilidade despertada pelas APAS e áreas urbanas consolidadas, não foi possível manter o espírito da Res. 13/90. Ficou tão somente a garantia que é dada para qualquer proprietário de terreno urbano ou rural (ou até menos). Quase se conseguiu os mesmos 3 Km para as RPPNs, não fosse a tão propalada “insegurança jurídica”, visto que os cinco anos para estabelecimento de zona de amortecimento não teriam cabimento nas propriedades particulares (!?!). Houve até quem dissesse que, caso fosse aprovado algo do gênero, não haveria mais interessados em criar RPPN... Que absurdo! Tínhamos 10 Km, sem nenhum regramento e não se deixou de criar uma só RPPN por isto!

Enfim, RPPNs passaram a ser ilhas de biodiversidade o que, na concepção moderna da biologia da conservação, não se sustenta. Sem perspectiva de apoio na REs. CONAMA 13/90, a formação de corredores ecológicos foi reduzida e o trânsito gênico ficou deveras fragilizado. Isto me induz a pensar que uma dada espécie em UC particular deve ser menos protegida (ou vale menos?) do que em uma UC pública – até mesmo se ela for uma Reserva Extrativista!Então, porque a RPPN deve ter plano de manejo obrigatório, com os raros direitos e os muitos deveres que regem um Parque Nacional? E ainda, qual a razão de averbar seu caráter de perpetuidade se temos casos em que Parques e Florestas Nacionais foram desafetadas (na prática, perderam território originalmente protegido)... É justo, um simples cidadão, ter todo um ônus – e até após a sua morte – correndo o risco de que seu objetivo preservacionista seja profanado? Terá ele somente o bônus de ser informado de que sua UC, bem difuso e reconhecido por órgão ambiental como de atributos ambientais significativos, será diretamente impactada por emprendimento? Para lembrar: um decreto proibiu a comercialização de mudas de viveiro da RPPN para além da sua cerca...outro, recentemente assinado pelo governo federal, permite o estudo energético dentro da RPPN! Na esteira do retrocesso, as demais UCs também poderão ser alvo deste “estudo”. Aliás, estudar por estudar? Com tantos contorsionismos e ações performáticas para justificar o injustificável, qual é a segurança jurídica para quem quer dar um futuro às próximas gerações?

* Lisiane Becker especialista/mestre em biociências, é presidente da ONG MIRASERRA (www.miraserra.org.br), Conselheira no CONAMA pela Região Sul. É funcionária concursada, atuando na administração ambiental municipal.
O ECO

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

O Haiti é Aqui

Sobre o Rio 2010, 2014, 2016 ...

Carlos Walter Porto-Gonçalves

O espetáculo da violência que se quer legitimar por parte do Estado globalizando Vila Cruzeiro e o Complexo do Alemão coloca a sociedade brasileira diante de si mesma. Vivemos uma época onde o capitalismo financeirizado usa como estratégia a produção de eventos como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Esses eventos desencadeiam excelentes oportunidades de negócios no setor da construção civil, turismo, marketing e publicidade, indústria esportiva e mídia conformando um bloco de poder que insta os estados a agir em seu interesse em nome de atrair investimentos e gerar emprego e renda. Como se tratam de eventos, o nome já o diz, seus empregos são eventuais e a geração de renda beneficia desigualmente os diferentes estratos sociais: alguns terão empregos na construção civil, uns serão porteiros depois das obras, e outros serão guias turísticos e repórteres por alguns dias. O setor financeiro, as incorporadoras de imóveis, as grandes redes hoteleiras, a indústria esportiva e as empresas de marketing e publicidade já estarão promovendo outros grandes eventos a serem transmitidos pelas redes globais de TV em canais abertos e fechados.

O fato é que essa globalização, que Milton Santos bem chamou de globalitarismo, com seu pensamento único, é uma bela síntese da combinação do capitalismo que opera por cima das fronteiras, globalizando, com seu sistema de estados territoriais brandindo um nacionalismo de mercado onde as seleções e os atletas disputam pódiuns e medalhas, onde quase sempre alguma Vila de alguma periferia sobe e cafusamente revela a outra globalização que quer ser premiada. Só eventualmente, pois a globalização de hoje guarda uma história de longa duração que começa em 1492 quando a Europa deixa de ser uma área marginal e passa a ser o centro de um mundo que se mundializa a partir da invasão do nosso mundo (Abya Yala) por eles chamados de novo mundo (América). Ali começava uma grande revolução tecnológica, no mundo das navegações, da arte militar, na cartografia, enfim, no pensamento em geral para além da revolução na geografia mundial, dando início à modernidade, a primeira modernidade de fala portuguesa e espanhola. Sabemos que uma segunda modernidade de fala inglesa, hoje hegemônica, desqualifica essa primeira modernidade e com isso a componente colonial que lhe é constitutiva. A primeira modernidade seria católica e a segunda acreditaria nos milagres da ciência (e se esquece que a fé na ciência não é ciência e, sim, ainda fé).

O Brasil, Cuba e Haiti desde o séc. XVI exportam açúcar e, ao contrário do que se ensina nos livros didáticos e até mesmo nas universidades e na pós-graduação, o açúcar não é matéria-prima. O açúcar é produto manufaturado e, à época, na Europa não havia manufaturas como os nossos engenhos de açúcar. A modernidade tecnológica estava aqui e não lá. O engenho de açúcar chegou aqui junto com os latifúndios e suas monoculturas, e como toda técnica comporta uma intencionalidade, como nos ensina Milton Santos, os engenhos e o latifúndio monocultor tinham uma intencionalidade posto que a produção não era para satisfazer as necessidades de quem produzia diretamente, mas sim para fora, para terceiros, para exportação. A monocultura, por exemplo, é uma técnica moderna e, portanto, feita não para satisfazer a quem produz. Essa coisa de local e de comunidade é tudo que a modernidade nega e desqualifica em nome do global, do geral, do universal. E como não era natural que as pessoas aceitassem produzir o que não fosse para elas mesmas, a modernidade introduziu a chibata, a escravidão. Afinal, nossos primeiros engenhos foram feitos com chibata para exportação! Made in Brazil e, já ali, commoditties: técnica de ponta com injustiça social.

A modernidade para nós tem sido isso: riqueza e sofrimento. Essa é a colonialidade que nos acompanha e que é o outro lado da moeda da modernidade. Somos modernos há 500 anos! E para que não se pense que estamos falando de um outro mundo, de um outro tempo, observemos o que nos falam os dados da ONU sobre o que vem se passando no mundo nesse período restrito que a mídia e os think thanks do neoliberalismo chamam de globalização: entre 1970 e 2010 a população urbana mundial aumentou em dois bilhões e cento e setenta e sete milhões (2.177.000.000) de habitantes! Já em 1990 tínhamos em cidades uma população equivalente a toda a população mundial de 30 anos antes (1960). Informes recentes obtidos no Vº Fórum Urbano Mundial realizado no mês de março de 2010 no Rio de Janeiro chamaram a atenção para o fato de 70 milhões de pessoas a cada ano se somarem à população urbana global. E que 90% desse aumento se dá nos países africanos, latino-americanos, caribenhos e asiáticos.

Mais da metade da população urbana mundial de 3 bilhões de habitantes, segundo o cientista social Samir Amim, vive sob condições precárias de trabalho e habitação, sendo que destes 1.290.000.000 vivem nos países da periferia e 270.000.000 nos países centrais. E nas periferias das cidades do primeiro mundo os pobres que lá estão são os imigrantes “quase todos pretos” ou de cor (sabemos que na linguagem racista quem tem cor são os outros e os outros são os não-brancos). Na escala local das periferias das cidades do primeiro mundo grita o sistema mundo moderno-colonial e sua globalização onde as classes sociais são também conformadas pela origem étnico-racial.

Uma nova geografia política mundial vem se reconfigurando onde o capitalismo financeiro que opera em rede se vê tendo que se ajustar à escala local onde vive a maioria dos “condenados da terra”, conforme a feliz expressão de Frans Fanon sobre os infelizes. Hoje é nessas periferias que proliferam as doenças da miséria globalizada como a AIDS ou mesmo a gripe aviária, como nas periferias da cidade do México em 2009. É nessas periferias urbanas que se espalham o varejo do mercado paralelo das drogas do narco-capitalismo financeiro e seu irmão-gêmeo, o mercado de armas. Ali, nas periferias-pobres-onde-quase-todos-são-pretos, jovens sem futuro matam e se matam portando armas globalizadamente intermediadas pelo capital financeiro onde os paraísos fiscais cumprem um papel central. E como um paraíso fiscal deve ser como todo paraíso numa ilha, o que é perfeitamente coerente com a lógica de um capital que se quer desterritorializado, isto é, sem compromisso com direitos e cidadania que tem no território nacional seu lócus de garantia, o emblema maior desse sistema mundo moderno-colonial não poderia deixar de ser um país-ilha onde “todos são pretos” e os impostos estão no nível ideal dos think thanks neoliberais (0%): o Haiti. E o Haiti expõe ao extremo as contradições do sistema mundo moderno-colonial haja vista ter sido o primeiro país do mundo a querer fazer a dupla emancipação: a do sistema de poder mundial moderno-colonial e a das oligarquias latifundiárias escravocratas. Os haitianos, à época parte do sistema colonial francês, viram a burguesia que tinha no Haiti sua principal fonte de acumulação ser revolucionária em Paris se posicionando contrariamente a estender ao Haiti os princípios da Revolução de 1789: a liberdade, a igualdade e a fraternidade não podiam atravessar o Atlântico nem a barreira da cor da pele. Os Estados Unidos retribuíram a estátua da Liberdade que os franceses lhes regalaram, embora a deixando numa ilha (Manhattan), e apoiaram os franceses contra a dupla emancipação que os haitianos acreditaram ser possível com a Revolução Francesa. Ali, os Estados Unidos deram seu primeiro passo imperial, logo esse país que fizera a primeira revolução de libertação nacional que o mundo conheceu no 4 de julho de 1776.

E foi ali no Haiti que, em 2004, ano em que comemorariam seus 200 anos de independência, que se reiterou o golpe de estado contra um presidente preto cuja liderança política havia sido forjada nas periferias pobres de Porto Príncipe. Diga-se de passagem, que foi um golpe de estado que se iniciara em 1992 quando Jean-Batiste Aristide, o padre da Teologia da Libertação, ganhara a primeira eleição livre do Haiti depois que a sanguinária dinastia Duvallier deixava o país depois de décadas para se abrigar no país das Luzes, a França. J-B Aristide foi seqüestrado pelo então Presidente Bill Clinton e levado a Washington onde teve que negociar as condições que o Império lhe impôs para tomar posse. Entre essas condições não mexer na estrutura de poder militar legada pelos Duvallier. Aristide e o povo haitiano pagaram caro, mais uma vez, suas pretensões libertadoras e tiveram que se curvar às forças hegemônicas do sistema mundo moderno-colonial.

E é ali no Haiti que vem se ensaiando o novo combate na nova configuração geopolítica do mundo onde as periferias onde “quase todos são pretos” devem ser controladas. O espetáculo globalmente transmitido ao vivo de tanques militares invadindo Vila Cruzeiro e o Complexo do Alemão no último dia 26/11/2010 atualiza essa história de longa duração no espaço concreto da miséria local de um sistema global. E os tanques que ali agiam numa inédita articulação do estado brasileiro em suas distintas esferas com a mídia foram tanques fabricados na Suíça que, até então, se acreditava ser o país do chocolate e do capital bancário-financeiro globalizado. Que aqueles jovens que com a sua fuga demonstravam o quanto desorganizado é o “crime organizado” se livrem do massacre que os espera. Mas a esperança necessária para que se livrem das balas que prometem atingi-los, aliás como também vem protagonizando nessa lógica absurda da violência e do medo, passa muito longe de tanques e da mídia. Passa “por uma outra globalização” muito longe do globaritarismo que não entende que é de “um mundo onde caibam muitos mundos” que carecemos. Que seja igualitária e que não tolere o outro porque o vê com alegria. E que a pólvora volte a ser usada para fogos de artifício. Aliás, elas só se fazem mais belas sobre um fundo preto.


Carlos Walter Porto-Gonçalves é professor do Programa de Pós-graduação em Geografia da UFF. Pesquisador do CNPq e do Clacso. Prêmio Casa de las Américas (Ensaio Hisórico-social) em 2008 e Medalha Chico Mendes em Ciência e Tecnologia 2004. É autor de vários livros e artigos publicados no Brasil e no exterior.Brasil de Fato.

Vozes e mãos femininas se levantam em Cancún


Por Emilio Godoy, da IPS




Cancún, México, 1/12/2010 – A hondurenha Analucy Bengochea e outras mulheres da etnia garífuna partiram do zero para enfrentar o demolidor furacão Mitch em 1998, na costa atlântica dessa nação centro-americana.

“Não estávamos preparadas para enfrentar o desastre. Não tínhamos acesso a projetos ou doações”, disse ao TerraViva a ativista Analucy, integrante do Comitê de Emergência Garífuna e coordenadora regional da Groots International, uma rede de grupos femininos de base.

Doze anos após o Mitch, as organizações de mulheres da costa hondurenha no Atlântico são modelos de esforços para adaptar-se às consequências da mudança climática e ajudar a mitigá-la nesta zona que habitualmente é cenário de intensos ciclones tropicais.

Entre 29 de outubro e 3 de novembro de 1998, o Mitch golpeou Guatemala, Honduras e Nicarágua, matou cerca de 11 mil pessoas e causou prejuízos econômicos de US$ 5 bilhões.

O comitê desenvolveu um programa de moradia solidária, que já permitiu construir 300 casas, administrar um banco de sementes nativas, para contar com material biológico em tempos de desastres e oferece assessoria para organizações semelhantes na Indonésia, após o tsunami de 2004, e no Haiti e Chile, países que sofreram fortes terremotos este ano.

A organização hondurenha está para começar um projeto regional que também envolve Guatemala e Índia na redução de riscos por desastres, com apoio do Banco Mundial.

Com apoio da Groots, surgida em 1989, o Comitê trabalha com cerca de 16 mil pessoas (75% mulheres) em 16 comunidades. Outro projeto é a plantação de mangues para restaurar praias prejudicadas em duas comunidades.

A Groots anunciará em Cancún uma plataforma comunitária para a prevenção de desastres, a partir da experiência que seus grupos acumularam em Honduras, Peru, Jamaica, Indonésia e Índia.

É uma das muitas atividades paralelas à 16ª Conferência das Partes (COP 16) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática que acontece em Cancún, no México, desde o dia 29 e termina no dia 10.

No Estado de Chiapas, a União de Mulheres Indígenas da Região de Simojovel, o Grupo de Mulheres da Selva e Mulheres Alternativas da Serra de Chiapas trabalham juntos contra os impactos da mudança climática em uma zona açoitada nos últimos anos por geadas inusitadas e copiosas chuvas.

A sorte das mulheres de Chiapas está ligada aos meteoros. O Estado, um dos mais pobres do México, tem 72 municípios muito expostos a desmoronamentos e inundações, e em outubro de 2005 foi atingido pelo furacão Stan.

“As mulheres plantam café, lidam com sistemas de poupança e empréstimo, centros de ecoturismo e albergues educacionais para os jovens”, contou ao TerraViva Teresa Cortés, consultora da Oxfam México, que capacita e financia a Federação Indígena Ecologista de Chiapas, à qual pertencem as três organizações.

Devido ao dano causado por Stan e das enchentes de 2007, a Oxfam ajudou esses grupos a criarem um modelo de prevenção e gestão de riscos climáticos. Agora estão na fase de traçar um mapa desses riscos.

A Federação reúne 18 organizações e 3.500 pequenos cafeicultores organizados em cooperativa em 26 municípios. Estas exportam café orgânico certificado para Holanda, Suíça e Alemanha. Com US$ 40 mil entregues pela Oxfam, os grupos de mulheres estão renovando os cafezais.

Na África do Sul as mulheres sofrem as alterações climáticas mais do que os homens, segundo a pesquisa “Gênero e mudança climática: um caso de estudo na África do Sul”, feito pela acadêmica Agnes Babugura para a fundação alemã Heinrich Böll.

As mulheres trabalham mais e por mais horas, caminham longas distâncias para obter água e assumem mais responsabilidade financeira para sustentar as famílias. “Há uma distribuição desigual de papeis e responsabilidades. Mas as mulheres estão mais informadas e são mais inovadoras para enfrentar os impactos da mudança climática”, disse à IPS Agnes, em Cancún.

O estudo se concentrou em dois municípios, Umzinyathi e Umhlathuze, na província de Kwazulu natal, habitada por mais de nove milhões de pessoas, das quais mais de cinco milhões são pobres.

Na COP 16 as mulheres reclamam políticas de gênero consistentes nos acordos que forem adotados e no financiamento. “Vamos cobrar que sejam destinados fundos comunitários para desastres”, disse Analucy. “Estamos resgatando a tradição participativa nas comunidades, estamos no processo de dar poder às mulheres”, destacou Teresa. Envolverde/IPS